Arquivo para fevereiro de 2022

Os clusters setoriais das Concessões

Para minha surpresa, não todos – mas uma grande parte daquelas pessoas com quem eu havia conversado sobre as dimensões das atividades das Concessões Públicas (http://blogconppp.com/?p=1002) e sobre os 04 Ciclos das Concessões no Brasil (http://blogconppp.com/?p=996) – voltaram a me procurar para uma “repescagem” dos assentos tratados e para que eu lhes explicasse o que eu quis dizer sobre os tais CLUSTERS SETORIAIS nesse mesmo contexto.

Comecei a lhes chamar a atenção para o fato de que, para o grande público, através das notícias e dos comentários de TV ou na Internet, geralmente se fala mais dos aspectos MACROECONÔMICOS do que dos aspectos MICROECONÔMICOS das Concessões.

Por exemplo: já se sabe que países como o nosso, precisam destinar entre 3% e 5% do seu Produto Interno Bruto (PIB) para realizar investimentos na infraestrutura econômica – por prazos entre 10 anos e 20 anos – para que eventuais lacunas ou falta de manutenção ou ampliação e modernização desses ativos de infraestrutura não criem o que se chama de aumento no “Custo País”.

Também já é comum se referir a grandes números que os investimentos em infraestrutura (feitas diretamente pelos Governos ou através das concessões) geram para o país: tais como o aumento da Formação Bruta de Capital Fixo em relação ao PIB.

Mas, para explicar os tais CLUSTERS, vamos acrescentar à essas duas dimensões, outras duas, para dar uma noção melhor do que pretendemos definir mais adiante, como as repercussões Espaciais e Setoriais: afinal, “o que” se faz se faz em “algum lugar” e em algum setor específico de atividade.

Uma analogia e um caso específico talvez ajudem a deixar mais claro o que se quer dizer com tudo isso:

A analogia será “tomada emprestada” de um jargão utilizado em alguns projetos de infraestrutura sob concessão (das concessões de TELECOM e de outras concessões como as de mobilidade urbana, energia, entre outras): a noção de Primeira Milha, Milhas Intermediárias e Última Milha:

Qualquer investimento (em infraestrutura, via Governo ou via Concessão), em geral possui esses 03 (três) componentes ou etapas: o ponto inicial de geração da oferta e do uso do bem ou produto provido, passando por fases ou etapas de distribuição ao longo do trecho onde se distribui e despacho o que é gerado no ponto inicial; e, por fim, o ponto de chegada ou de destino final do que se gerou desde o início do processo do bem ou serviço que é ofertado.

Se pensarmos desde a origem das concessões no Brasil, no primeiro dos quatro ciclos de 50 anos cada que tivemos no país até agora – vide o texto já citado (http://blogconppp.com/?p=996) –ou seja, no Ciclo dos 50 anos do II Império –, as primeiras concessões eram TODAS ELAS criadas do zero: as ferrovias, os portos, o esgotamento sanitário, a iluminação pública, a cabotagem, os projetos na área de energia, e daí por diante.

Sua repercussões eram não apenas macro (entravam as divisas dos investimentos diretos feitos pelo capital estrangeiro que financiou as mesmas de modo preponderante nesse primeiro ciclo). Mas, houve repercussões microeconômicas extremamente relevantes: novos setores e empregos foram gerados em outros setores que não apenas os dois grandes setores até então que eram a produção agrícola, o Comércio Importador e as atividades de governo e de serviços de apoio às atividades básicas. E, também, impactos regionais dessas atividades, uma vez que as mesmas se fizeram em TODAS as principais províncias do país de então, consolidando as economias regionais e a elas acrescentando sua margem de contribuição ao crescimento, produtividade e economia s internas e externas por elas geradas.

O caso da Iluminação Pública (IP), ao longo do tempo, é bastante elucidativo.

Para se implantar a primeira Concessão de IP – de 1850 até 1875 – foi preciso MUDAR o processo e a FORMA da atividade até então prevalecente: sair do USO de gorduras e óleos de origem animal e vegetal como fonte de iluminação PONTO A PONTO para um processo em que se passou a utilizar o gás hidrogenado de carbono, derivado da queima do carvão para iluminar remotamente os Pontos de Luz determinados pela Concessão: exatos 3.027 postes de iluminação ( a rede de IP de Iluminação de então, a RIP).

Para isso, foi preciso criar uma INDÚSTRIA DE QUEIMA DO CARVÃO – os Gasômetros – e desenvolver atividades de fundição e de pequena metalurgia num contexto em que os grandes setores de atividades existentes eram a Atividade Exportadora de produtos minerais e agrícolas, o Comercio Importador e Exportador e as atividades de apoio do Governo e de serviços em geral.

Ou seja, mudou a MATRIZ DE EMPREGO E RENDA nas províncias do Rio de Janeiro (capital), São Paulo e em outras capitais onde se criaram os Gasômetros.
Nos dias de hoje, com as plantas das concessões de energia consolidadas a partir de suas formas de energia limpa e renovável, o impacto dos projetos de IP também se modificou.

Existem os mesmos efeitos macro, micro, setoriais e espaciais já levantados (e que são comuns a todos os projetos de infraestrutura): surgiram plantas industriais para atender a todo o ciclo de geração de atividades que VEM ANTES e que VEM DEPOIS que as diferentes formas de energia são geradas e disponibilizadas no GRANDE SISTEMA INTERLIGADO que abastece de energia os consumidores individuais e empresariais de energia: e, no caso em particular da IP, o Governo das cidades que se constitui no Poder Concedente.

Pulando (sic) do primeiro para o atual QUARTO CICLO das Concessões no Brasil, a atividade de IP se transformou radicalmente: as grandes empresas de energia que provisionavam tanto a geração como a transmissão e a distribuição de energia foram todas segmentadas e tiveram seu controle acionário (em sua quase totalidade) concessionadas para o capital privado estrangeiro ou nacional.

E, assim, às atuais empresas distribuidoras – a quem cabe a oferta de serviços de IP hoje em dia – são um cliente importante das geradoras e das transmissoras de energia.

Ao CLIENTE FINAL da IP (as Prefeituras das cidades brasileiras) cabe “cobrar” pelo uso da energia nas residências e nas empresas para criara um seeking funding através das chamadas contribuições para pagamento de energia elétrica (COSPI ou CIP) que proverão a liquidez para pagamento dos custos de manutenção dos serviços públicos de iluminação.

De 05 em 05 anos, há que se relicitar esses contratos com as distribuidoras regionais e não podem exercer o poder de compra apesar de serem os ÚNICOS e os MAIORES consumidores individuais de energia para um fim específico (a Iluminação Pública), OU porque os ofertantes de energia de outros pontos do país temem correr o “risco governo” – ainda que por estarem aportadas num FUNDO DE ILUMINAÇÃO com CNPJ diferente das prefeituras e por serem fiéis depositários dos recursos que tiram compulsoriamente via COSIP/CIP dos consumidores residenciais e não residenciais de toda a ordem – OU porque preferem correr o risco privado das distribuidoras privadas OU porque foi definido assim nos Editais de Concessão das distribuidoras.

Também se deve partir do princípio de que as Distribuidoras Concessionadas exercerão a certificação de produção dos bens e serviços de CAPEX e OPEX que influenciam a oferta de energia visando sempre o melhor e menor preço ao consumidor final, no que serão de perto acompanhados pelos órgãos de controle externo do único e maior comprador de IP (o Governo) e pelo Papel Institucional indelegável da Agência Reguladora que rege o setor elétrico.

Fato é que neste 4º Ciclos de Concessões a atividade de IP apresenta um espectro de ramificações e influência que pode ser depreendido a partir do quadro a seguir:

Ou seja, uma das concessões mais antigas (a de IP) permite observar que vistas de modo amplo, a ATIVIDADE FINAL de concessão depende e gera uma enorme cadeia (ou CLUSTER) de atividades que se ligam e interligam e que terão reflexos regionais e setoriais além dos efeitos micro e macroeconômicos a que estão sujeitas.
Por isso as concessões hão de ser abordadas em seus complexos estruturados (CLUSTERS SETORIAIS): sejam os complexos de mobilidade urbana, de energia de saúde, de iluminação pública, de transportes aero marítimos ou rodo ferroviários, e daí por diante.

Porque o custo, a produtividade, a liquidez e a sua produtividade requerem que não apenas a ATIVIDADE FINAL, mas TODAS AS ATIVIDADES que lhes são antecedentes ou consequentes estejam dimensionadas para bem sustentar a expectativa de seus resultados.

As diversas dimensões das Concessões Públicas

Dia desses, conversando sobre o tema das Concessões Públicas com pessoas que questionavam o porquê de tanta ênfase a essas atividades no contexto das políticas públicas, percebi que apesar do tanto que se fala sobre as Concessões, poucos se dão conta do quanto que estamos envolvidos no que se poderia chamar de “O Mundo das Concessões”.

Parece nome de documentário do National Geographic ou de outro programa de canal de TV sob assinatura: ou até nome de aula nos canais de Supletivo ou de Educação.

Mas, na verdade, a amplitude que envolve essa discussão que tem menos de 30 anos no debate mais recente — embora em artigo anterior (Os 04 Ciclos de Concessões no Brasil”, in Academia.edu, no link https://www.academia.edu/69069443/) tenhamos mostrado que a discussão remonta a mais de 200 anos só no Brasil –-, pode-se dizer que pela evolução do assunto se pode explicar muito das transformações que o país tem experimentado na sua matriz econômica nesta sua atribulada existência.

É como se pudéssemos pensar em uma disciplina como “Economia Política das Concessões”.

Exagero?

Então vamos especular um pouco essas nuances ou dimensões todas que estão subjacentes quando se fala sobre as Concessões nesses quase 200 anos na história mais recente do país.

Ao grupo de pessoas a que me referi antes, mostrei o slide a seguir, onde se destacam as imagens do Bondinho do Pão de Açúcar (RJ), do Elevador Lacerda (BA), do Parque Trianon (SP), ou do Zoológico do Rio de Janeiro (RJ).

Custou àquelas pessoas acreditarem, num primeiro momento, que em diferentes épocas, que estes locais que para elas estão associadas a atividades de lazer ou de entretenimento, pudessem ser objeto de concessões por diferentes motivos: ligar dois planos de uma cidade (a Cidade Baixa à Cidade Alta) para assegurar o transporte público de pessoas em coches puxados por cavalos ou muares, em pleno século XIX, por exemplo, como foi o caso da concessão dos antigos ônibus em Salvador. Ou que os Parques Urbanos como o Trianon e o Ibirapuera em São Paulo, ou os parques Zoológicos do Rio de Janeiro e de São Paulo fossem hoje geridos por concessionários privados. Ou que o conhecido Bondinho do Pão de Açúcar tivesse sua permissão de uso autorizada na origem pelo Imperador Pedro II.

Poderia ter falado de muitos outros exemplos, mas aí resolvi fazer uma brincadeira: perguntei a cada uma das pessoas o que costumava fazer após se levantar todos os dias para começar a sua rotina semanal.

E, para cada uma das atividades descritas, chamei a atenção para o fato de que TODAS ELAS estavam associadas a algum tipo de Concessão Pública!

A brincadeira foi até o ponto em que algumas delas chegaram a perguntar: ”Mas, afinal, o que NÃO É concessão pública”?

Na verdade, houve até quem “filosofasse” ao dizer que…”afinal, a Vida não é ela mesmo uma concessão transcendental?”

Bom, mas a verdade é que essa percepção é muito mais ampla do que se pode imaginar: afinal, as diversas formas de Concessão Pública – do latim concessio que quer dizer “cessão por prazo, preço e condições definidas que ao seu término volta á posse a ao domínio de quem concedeu algo ou alguma coisa a terceiros”—, tem origem na época feudal, onde o Senhores eram o Poder Concedente para exploração de suas terras e domínios, sob a forma de cessão de uso, arrendamento, meação…E que até cobravam impostos e taxas para os seus parceiros (mesmo não sendo “governos”)…E que é daí que se evolui para a organização de diversos Senhores que sustentavam os Estados Nacionais que se expandiram em busca de terras e possessões no além-mar (pois a riqueza, a produção, a renda, as riquezas e poder vinha da terra, o fator primário de produção).

Assim, se aliarmos essas “concessões privadas” que foram a origem das concessões públicas, e que evoluíram para as novas formas privadas de concessão como as franquias, as licenças de uso, os arredamentos e por aí vai, até parece que somos todos uma GRANDE ILHA DE CONSUMIDORES de bens e serviços cercados de CONCESSÕES E CONCESSIONÁRIOS por todos os lados…

E, poderíamos ainda emendar: que “tipos” de consumidores para que “tipos” de produtos?

De início é importante perceber que cada produto ou serviço concessionado possui uma UNIDADE DE MEDIDA em que é expresso ou denominado:

E se existe uma UNDIDADE DE MEDIDA e se existe quem demande essas unidades, em quantidades e para uso tão diferentes, também existem MERCADOS específicos que podem ser estudados em suas especificidades para que se verifique “quê” tipos de estruturação de atividades, negociações, formas de custeio e investimento (entre tantas outras qualificações) podem ser utilizadas para o melhor desenvolvimento desses vários “Mercados de Concessão”.

Mais especificamente, é importante perceber que um MESMO PRODUTO OU SERVIÇO CONCESSIONADO pode atender tanto ao CONSUMO INDIVIDUAL de uma pessoa, quanto o CONSUMO EMPRESARIAL de um agente que se organiza para ofererecer seu serviço para a sociedade.

Como assim?

Cada um desses produtos ou serviços concessionados denominados no slide anterior, pode ter um uso enquanto BEM DE CONSUMO INDIVIDAUL como BEM OU INSUMO BÁSICO OU INTERMEDIÁRIO para a produção e outros bens e serviços.

A ENERGIA ou a ÁGUA, por exemplo: atendem demanda básica, essencial, de pessoas para sua sobrevivência e reprodução: mas, para certas empresas – como as que usam a ÁGUA ou a ENERGIA para produzir bens ou serviços finais ou para movimentar suas máquinas e equipamentos, são elementos primordiais às suas atividades:

Assim, precisamos de água e energia e a compramos à vista, pagando por seu uso mensalmente: nós e milhões de outros consumidores individuais.

Já para as empresas produtoras de bens e de serviços, CADA AUMENTO DE CONSUMO deve ser planejado e comprado em grandes lotes, a prazo (ou a termo): e contratado com os Concessionários que oferecem suas oferta, por delegação do Poder Concedente desses bens e serviços.

O que é BEM DE CONSUMO para um é INSUMO para outros: em quaisquer dos outros produtos e serviços destacados: possuem NECESSIDADE CONTÍNUA o que torna a sua ESSENCIALIDADE uma fonte importante para levantamento de recursos necessários para a sua oferta; antecipadamente, para atendimento das necessidades dos seus usuários ao longo do tempo.

Ou seja, são itens que no MERCADO À VISTA ou no MERCADO DE FUTUROS possuem ou têm atratividade para que seus ofertantes tenham a acesso a recursos não-financeiros (ou que não gravam patrimônio ou o endividamento das empresas) para a realização de investimentos necessários para o aumento contínuo de sua oferta à população e ao mercado.

Bem, eu estava para demonstrar como cada uma dessas atividades gera transformações profundas na economias dos países como o Brasil – através dos vários CLUSTERS SETORIAIS que todos eles acabam por resultar, quando percebi a cara de paisagem criada por essa overdose de informações…

Assim, pedi que eles pensassem sobre o papel e a influência das CONCESSÕES PÚBLICAS em seu dia a dia, no que fui entusiasticamente saudado (menos por qualquer mérito do que pelo nó que causei na cabeça daquelas pessoas).

Ficamos de nos encontrar para falar do tal efeito matricial (…) das concessões!

Se eles voltarem, prometo escrever sobre “como foi” essa conversa, em outra oportunidade.

Saudações concessionadas!!!

Os 04 (quatro) ciclos das Concessões no Brasil

A aprovação dos novos marcos regulatórios do Saneamento Básico e das Ferrovias no ano passado, foi destacado pela imprensa e por analistas como um fato histórico auspicioso.

Primeiro, por significar que “após mais de 100 anos” o setor Privado voltava a investir na expansão da malha ferroviária que, apesar das dimensões continentais do país, responde por algo em torno de 20% do volume de cargas movimentada pela sua Matriz Intermodal de Transportes: de fato, de seis a oito empresas vão fazer um investimento “green field” – da primeira à última milha, isto é, dos projetos à compra e assentamento dos dormentes e trilhos, estações de transbordo de cargas, materiais e pessoas, compra de locomotivas e operação, manutenção e reinvestimento da malha, além da integração com a malha já existente.

Segundo porque, no caso do Saneamento Básico, o novo referencial permitirá que mais de 50% das cidades brasileiras tenha, por fim, acesso à produção de Águas e à coleta de Esgotos e Resíduos Sólidos, o que impacta diretamente a qualidade de vida, a saúde, o aprendizado e até a produtividade do trabalho a médio e longo prazos, já decorridos quase ¼ do Século XXI, que marca a passagem para a decantada Economia 4.0!

Para quem tem como Marco Temporal das Concessões a aprovação dos diplomas legais das Lei Geral das Concessões, a Lei 8.987 de 1995 e a legislação que incluiu as Concessões Administrativas e Patrocinadas, sob é égide das chamadas Parcerias Público Privadas (PPP), a Lei 11.079 de 2004, a introdução do “vetor temporal secular” causou certa admiração.

Na verdade, a expansão das Concessões de todo o tipo após os referidos diplomas legais, significou, em boa medida, a assunção de plantas de concessão já existentes na economia brasileira, assim como a realização de investimentos que poderíamos chamar de “brown field”, nas etapas de “última milha ou de milhas intermediárias” em ativos já existentes em vários segmentos da economia, como as rodovias, os ativos de geração-transmissão-distribuição de energia elétrica e do gás, as redes de Águas e Esgoto, as malhas de transporte urbano de massa (dos ônibus e dos trens urbanos, chegando às linhas dos metrôs), a transmissão de voz-dados e imagens das plantas de telecomunicações, os portos e as ferrovias e os investimentos na infraestrutura urbana e social (nas áreas de Saúde, Educação, Sistema Viário e, por extensão, também em parques e áreas urbanas ociosas, entre outros).

A maturação das concessões a partir desse período mais recente, entretanto, ainda se ressente de amadurecimento em alguns vetores como a bilhetagem de serviços em áreas como a energia ou Águas e Esgoto e Gás, que ainda se faz “door to door”, tal como se cobrassem pela venda de cosméticos ou utensílios de uso doméstico (quando e se é feita a devida “leitura presencial”); ou a forma estéril de financiar ativos, desconsiderando o valor intrínseco do “produtos ou serviços de concessão” (para uso individual ou empresarial), embora o BNDES em boa hora pareça estar mudando o cenário das grotescas garantias corporativas para financiar ciclos de produtos com alta essencialidade e retorno como são os produtos e serviços gerados sob a forma de concessão.

Porém, sob uma perspectiva temporal mais adequada, as atividades de Concessão explicam (sic) boa parte da formação econômica do Brasil (aliás, em termos funcionais, uma Concessão da Estado Nacional Português, enquanto colônia de Portugal).

Sob este enfoque, a Economia Política das Concessões, no presente, encontra-se no que se poderia chamar de 4º Ciclo das Concessões no Brasil:

Nos 50 anos do II Império, as Concessões de deram num momento em que a Economia Mundial passava para a sua Fase 2.0 (após a Revolução Industrial 1.0, acontecida a partir de 1776), com a introdução de inovações como o vapor, a energia elétrica, os Caminhos de Ferro, o telégrafo e o telefone e outras invenções e inovações que mudaram o perfil da produção, a renda e do emprego estrutural.

Atento às mudanças da época, o Imperador fomentou a atração de investimentos diretos estrangeiros – que se juntaram a capitais privados nacionais acumulados, seja pelo tráfico de escravos, pela renda do setor primário exportador formado nos ciclos coloniais (do açúcar, do algodão, do cacau, dos minérios e do ouro, entre outros), seja pelos capitais oriundos do Comércio Importador da época –, para financiar o 1º Ciclo de Concessões no país, que cobriu das Ferrovias aos Portos, passando pelas Comunicações (cabos submarinos com a Europa e EUA e telefonia), a Energia das Quedas D’água, transportes urbanos de massa (bondes), Navegação de Cabotagem e até a (hoje tão em moda) Iluminação Pública.

A característica maior, é que eram TODOS investimentos “green field”, da “1ª à última milha”, ou seja: nas ferrovias, do atração dos investimentos diretos à importação dos trilhos e do carvão até a importação das locomotivas, dos dormentes, a construção física das malhas ferroviárias, passando pela construção das Estações e da implantação das linhas. Na Iluminação Pública, da geração da energia primária (do gás de hidrogênio carbonado) através das construção dos Gasômetros que processavam o carvão importado, passando pelas fundição de tubos e luminárias até a última milha dos lampiões a gás.

No 2º Ciclo (nos 50 anos da República Velha até 1950), a crise financeira que começou em 1891 e foi o embrião da Crise de 29, além da eclosão de duas Guerras Mundiais, “fechou” a geração de riquezas dos produtores do agronegócio de então, a par dos seus efeitos sobre o Comércio Importador. E – com a monetização do trabalho até então escravo e o pagamento dos imigrantes que, desempregados pela Economia 2.0 viera, vieram a se empregar extensivamente nas produções de agro produtos de exportação, fez aparecer a erosão dos preços relativos (inflação) e defasou as tarifas públicas cobradas pelos concessionários das concessões de então. Revoltas como a dos carroceiros (em protesto ao avanço dos bondes) e sobre o preço dos transportes, posteriormente, levaram à decretação da caducidade de várias concessões.

Entre elas a de Esgotamento Sanitário (sim o Brasil do II Império foi o terceiro pais do mundo a ter um Projeto de Saneamento Básico ainda em 1863 via esgotamento sanitário (atrás apenas de Londres (UK) e Hamburgo, na Alemanha), através da “The Rio de Janeiro Improvement and Company”, ex-CEDAE, privatizada em 2021 e neste início de 2022), que no 2º Ciclo das Concessões foi estatizada pelo primeiro Governo Vargas.

Já no que poderíamos chamar de 3º Ciclo de Concessões (de 1950 até o ano 2000), com a Economia Mundial passando para sua fase 3.0, com a automação de produtos e processos de produção e de prestação de serviços, entre outras mudanças fundamentais na linha de frente e na retaguarda das atividades econômicas, veio um período impactado pelos efeitos da reconstrução mundial gerada pelo fim da 2ª Guerra, onde a ação de um Estado indutor de progresso e desenvolvimento ocupou as ações de vários governos. E, em países como o Brasil redundou num papel onde via crédito e finanças públicas ou via a intervenção direta de empresas estatais se produziriam os produtos, insumos e serviços necessários para consolidar o papel dos agentes privados nacionais e estrangeiros na oferta de bens e produtos industriais, importantes para a geração de produtos, renda, emprego e arrecadação para manutenção de empresas públicas (sob a doutrina do chamado Tripé Econômico entre empresas Estatais, Privadas Nacionais e Privadas Estrangeiras para a consolidação de uma economia resistentes até às oscilações cíclicas da encomia externa, (na época fraturada pela alta do petróleo e das taxas de juros internacionais, até do Banco Mundial e do FMI).

Assim como correu na passagem do 1º para o 2º Ciclos, os impactos externos causaram a defasagem tarifária que, mais uma vez, erodiu e defasou o preço de investir, operar, manter e reinvestir nas economias concessionadas. E o resultado, como corolário de um profundo ajuste do Setor Público no início do ano 2000 (no 4º e atual Ciclo de Concessões, com a Economia Mundial em nova fase de mudanças, agora em sua Versão 4.0), abriu uma nova fase de expectativas quanto ao futuro das economias concessionadas.

Sim: o PREÇO foi sempre o vilão das crises da economia e da atividade concessionada até aqui.

Hoje, como dito de início, há a convergência da necessidade de investimentos “green field” da primeira à ultima milha (como no caso dos investimentos em ferrovias e no saneamento básico e vários outros) e na modernização e adequação de investimentos concessionados assumidos na fase de transição entre o 3º e o 4º Ciclos de Concessões (em áreas como bilhetagem e estrutura de capitais e investimentos), num momento de agrura fiscal crônica causada pela pandemia (mundial) e pela falta de perspectivas e de planejamento da saída (nacional) onde uma REFORMA TRIBUTÁRIA continua a ser a maior necessidade – a rigor, desde o 2º Ciclo de Concessões, pelo menos.

Mais uma vez as Concessões terão por certo um papel inarredável neste contexto: resta saber se haverá serenidade e visão prospectiva para permitir a retomada do crescimento e da urgente redução das desigualdades que atrasam e constrangem o desenvolvimento do país.