A três dias do final do ano, o país decidiu pela não prorrogação do que se convencionou chamar de Ajuda Emergencial: a alegada recuperação da economia – “em forma de V” – justificaria a sustentabilidade da decisão.

Como os indicadores econômicos costumam refletir o comportamento das variáveis que mensuram com uma defasagem média entre 45 a 90 dias – o governo parece estar jogando com a possibilidade de que só a partir de fevereiro/março haja o recrudescimento das pressões pela necessidade de prorrogação da Ajuda.

Estão sublimadas (sic) dessa expectativa, a excitação friccional do maior giro nas compras de final de ano (positiva) assim como o feito do choque gregoriano (negativo) do recebimento das faturas institucionais de início de ano como impostos (IPTU, IPVA), de preços de transportes urbanos (ônibus, trens e Metrôs), matrículas, faturas de cartão de crédito, apropriação de juros do cheque especial, e daí por diante.

Também a manutenção de efeitos causados por pressões decorrentes de medidas de contenção sanitária (que afetam emprego, renda e expectativas), tampouco estão consideradas nessa aposta.

Por outro lado, havia que se tomar providências para ampliar consideravelmente os gastos em todo o cluster de atividades ligadas direta ou indiretamente à prestação dos serviços de saúde, para evitar seu colapso, mercê da magnitude do evento sanitário. E, adicionalmente, prover pesquisas (vacinas), meios e formas de enfrentar a a pandemia.

Enquanto calamidade global, é uma ESCOLHA IMPOSTA às sociedades, definir algum tipo de Ajuda aos agentes econômicos, ressalvadas as hipóteses singulares de negar a pandemia, seus efeitos e ser indiferente à sua superação: quanto mais não fosse, pelo inegável impacto da mesma sobre as condições econômicas até então vigentes.

E as ESCOLHAS, em termos de políticas públicas de enfrentamento, hão de levar em conta particularidades da situação fiscal, monetária e de liquidez de cada país e da sua melhor ou pior situação estrutural de acesso e provisão sanitária.

O que é irrecorrível, em um primeiro momento – e até à revelia da situação melhor ou pior de cada país em ternos conjunturais – é que algo precisa ser feito: e do ponto de vista instrumental, SUPRIR os desvãos de renda é o que mais influenciará a decisão de cada dirigente ou ente político de cada nação.

Os países que têm superávit fiscal – ou saldo positivo de renda a transferir entre agentes econômicos locais – possuem lastro de menor impacto a ser aportado, sem reembolso, a qualquer de seus cidadãos: com a recuperação, compensam-se e se retomam, a posteriori, o eventual saldo fiscal.

Há quem tenha que lançar mão de emissões primárias de moeda para recompor a liquidez da economia e prover atendimento mínimo a parcelas de população desassistidas ou vulneráveis, sem impactar níveis de endividamento público direto.

Ou, se necessário, emitir títulos públicos ainda que com alto endividamento ou com restrição da capacidade mediata da economia em prover liquidez para cumpri com o serviço futuro das dívidas. E prover poder liberatório a futuro para os tomadores de títulos públicos para OU usar os mesmos como moeda em projetos de privatização, concessões ou parcerias com os entes públicos, OU, ainda para liquidação a futuro da carga de impostos a ser recolhida.

Quanto mais desequilibrado for ou estiver o país em sua situação fiscal, maiores serão as dificuldades de se equacionar essa AJUDA: menos por ela em si mesma, no curtíssimo prazo, e mais porquê, a se manter a situação que levou à situação de desequilíbrio, menores serão as possibilidades de não se ABRIR MÃO da situação de Ajuda, por maior intervalo de tempo.

Portanto, agora ou em fevereiro/março do ano que vem, é impossível abrir mão da Ajuda, esperando por decisões estruturais que dependem INCLUSIVE de quem deveria dar maior contribuição aos esforços fiscais para prover lastro não impactante para o seu financiamento da provida pelo atual governo (estamentos corporativos e parasitários do setor públicos, como no Judiciário, Legislativo e Executivo); ou os entes contributivos fiscais (setores e atividades com isenções fiscais, pejotistas (sic) em geral); as classes de renda mais alta (que em todo o mundo estão dando e até pedindo maior tributação para diminuição das abissais situações de desigualdade e inclusão social); e daí por diante.

Aliás, esse “diferimento sazonal” do ajuste – que pode ser abreviado devido a decisões equivocadas e oportunistas como aumentos de salários de mandatários públicos de entes federados no momento em que Estados e Municípios TAMBÉM estão recebendo do TESOURO NACIONAL compensações por perda (queda) de arrecadação fiscal devido aos efeitos da pandemia) ou concedendo aumentos de impostos e carga fiscal ou reajuste de transportes coletivos – é uma decisão irrecorrível.

A ironia deste tema é que, quem defende a manutenção da Ajuda (e sua institucionalização, como já se delineia para outros países) e quem sustenta a sua eliminação (pelos efeitos sobre endividamento público ou impactos fiscais), chega a duas importantes limitações.

Ambos requerem para sua sustentação, ajustes estruturais que não se dão no curto prazo (privatizações, concessões e parcerias, aumento dos impostos diretos na composição da atual carga fiscal, restrição ou eliminação de gastos dos três poderes em salários e comissionamentos e daí por diante).

Assim como ambos parecem esquecer que aqueles que podem decidir por tais cortes e ajustes que já possuem a idade do tempo que se fala de reformas no Brasil, seriam os mais afetados por boas práticas de política fiscal e de concessão de subsídios e proteções tarifárias na economia.

E que seus interesses estão solidamente constituídos nas bancadas funcionais que promovem e perpetuam o atraso na sociedade brasileira: dentro e fora dos poderes legalmente constituídos.