O casamento do tempo com a esperança

Imagine uma empresa que vende um produto que tem boa aceitação no mercado; que precisa investir (1) para ampliar sua capacidade de produção e atender a demanda crescente; mas seu acionista está endividado (2).

Por outro lado, a economia está com inflação em alta; o governo só conhece a alternativa de aumentar os juros para conter a demanda de empresas e indivíduos, já que que não dispõe da “outra perna” de sustentação da política econômica que é a política fiscal, visto que adia há tempos uma reforma tributária que inclua a todos os que geram renda no país e não apenas os que pagam impostos indiretos; e é leniente com a política fiscal de gastos públicos ruins e suntuários com suas castas corporativas dos três poderes (e, agora, também da casta militar emergente), além de dilapidar e vender ativos para pagar despesas correntes que nunca param de crescer.

O custo de tomar recursos em banco (3) está proibitivo (pois o custo do serviço da dívida é maior que o retorno interno da atividade da empresa); a captação de outros recursos (4) como debêntures também exige o pagamento de juros reais. Com inflação em alta; e a captação em Bolsa de Valores pressupõe tomadores que estão arredios face à volatilidade (5) da economia.

Num contexto destes, há dois elementos-chave que precisam ser considerados: não fosse o quadro adverso, há mercado consistente para a empresa? Há compradores que têm interesse em continuar a comprar os produtos da empresa permanentemente: por 12, 24, 36 ou até 48 meses, por exemplo?

Se a resposta a estas duas questões for o “SIM”, então “o tempo pode se casar com a esperança”.

Por esta feliz conjunção, é possível uma alternativa que cria os recursos para investir (1); não implica em dívidas para as empresas (2); prescinde dos juros (3) para alavancar a produção ou para investir, ou o pagamento de prêmios (4) de risco ou de lucro (5).

O lugar do casamento é a Bolsa de Futuros: e os papéis que registrarão o evento são os CERTIFICADOS DE RECEBÍVEIS (CRs), para ancorar a necessidade de alavancagem operacional e de investimentos da empresa.

Com a emissão primária dos CRs, lastreado na formação de ativos e de bens reais que serão usados na produção do lado real da economia, antecipam-se os recursos de caixa que irão comprar também antecipadamente (gerando encomendas para fornecedores de toda a ordem) a preços relativos mais baixos, possibilitando aos tomadores destes CRs (os futuros usuários desses bens ou ativos) melhor ocupação de capacidade de produção, custos de operação e de suprimentos durante o horizonte de prazo acordado na emissão dos CRs.

Essa antecipação de demanda também possibilita que o interesse pela aquisição desses CRs para contar com a entrega física ou tangível de bens ou ativos, também alcance quem procure aplicações com prazos de retorno consistentes, com lastro em produção real e tangível, e certeza de liquidez e segurança na sua liquidação em seus vencimentos.

Além do mais, a geração de caixa via antecipação de recebíveis, atinge TODOS os segmentos da economia: sua utilização é plausível como funding para atividades sob o regime das concessões públicas (concessões plenas, ou concessões administrativas ou patrocinadas).

Pode também ser um “mecanismo alternativo” para gerar um novo ciclo virtuoso de fundos de origem não fiscal, para alavancar investimentos no setor público, contando com a Certificação Prévia das obras e dos investimentos a serem retomados ou iniciados, através das várias Empresas Certificadoras que já chancelam a emissão de outros papéis no mercado. Neste caso, além dos critérios de certificação exigíveis, podem agregar o RATING DE CRÉDITO do Tesouro Nacional para os diferentes entes federados emissores desses papéis.

Com este caminho, deixa-se de lado o que está turvando a elaboração do cenário econômico mais imediato: a incapacidade de gerar recursos livres que gerem um efeito virtuoso sobre a geração do Produto Interno Bruto (PIB).

E o crescimento consistente do PIB é fundamental e fatal pois ele é o DENOMINADOR comum que referencia a saúde financeira de uma economia eis que todos os demais indicadores são medidos (enquanto NUMERADOR) em relação a ele: o déficit público, a formação bruta de capital fixo, o endividamento bruto, os dispêndios de pessoal, as desigualdades e disparidades funcionais da renda, e daí por diante.

Ou se promove e fomenta esta providência que consegue conjugar estas duas vantagens tão importantes para a economia (o tempo e a esperança) ou no dia que controlarmos o NUMERADOR dessas relações teremos regredido com o DENOMINADOR (o PIB) ao seu nível real mais baixo nos últimos 20 ou 30 anos.

Eleições, esgotamento fiscal e os novos fundos patrimoniais

Interessante a fase pré-eleitoral atual: (1) só se fala da eleição majoritária para a presidência e de alguns governos estaduais que possuem os maiores colégios eleitorais que podem impactar na eleição ao Planalto.

(2) Nada se fala das eleições proporcionais dos legislativos estaduais e federal que, afinal, irão eleger os atores que sustentarão as ações e propostas em jogo nas eleições majoritárias.

(3) Pouco se fala de ações e propostas além das platitudes e generalidades de sempre. Mesmo o candidato que tem um livro editado sobre o assunto, não resiste a
espicaçar os dois candidatos que polarizam o certame maior.

(4) Não está claro (ainda) se haverá eleições: mente-se, institucionalmente, o tempo todo, sem pudor nenhum. Tanto os representantes dos poderes constituídos como aqueles que se arrogam o tempo todo como membros de um etéreo “Poder Moderador”, para espanto póstumo do que engendraram a Constituição Imperial de 1.824.

Ou seja, aqueles que dizem exercer o papel de “moderador” desde 1.889; desde quando (aliás) apresentam uma longa ficha corrida de desvios à ordem democrática, e irresistível pendor à prática de golpes e outras formas de solapamento das Constituições desde então vigentes.

No popular: quem vai falar de fato a verdade para todos nós, já que “todos nós”, do topo à base da pirâmide, estamos perdidos desde (pelo menos) 2013. Ou seja, às vésperas de mais um subciclo de 10 anos perdidos, desde metade dos anos 80 do século passado.

Quem vai dizer, por exemplo, que – face ao perfil de gastos público atual, e aquele que está sendo cevado pelas promessas de campanha majoritária maior e à restrição do teto de gastos – esgotou-se a capacidade fiscal em prover os recursos necessários no Orçamento Público pelos próximos 10 anos pelo menos?

E que, seja pelos efeitos do baixo crescimento dos últimos anos, da pandemia no país e no mundo, somado à absoluta incapacidade de se congelarem ou rever para baixo, em termos reais e nominais, salários, gastos constitucionais obrigatórios e tarifas públicas (mercê de contratos de concessão) e de preços de insumos vitais indexados à cotação de moeda internacional, estamos numa fase de esgotamento da capacidade fiscal e tributária em seus moldes atuais.

Por isso, já há quem louve a volta da inflação 02 dígitos, pois ela faz crescer a ilusão monetária em ano de eleição, e dá aparência que a arrecadação bruta do Setor Público vai atender a todas as promessas sem lastro fiscal que estão sendo feitas.

Quem falará a Verdade Inconveniente? Os candidatos? Os marqueteiros? Os Faria Limers? Os empresários? Os banqueiros? Os líderes religiosos? Ou o vencedor (e os demais vencedores dos pleitos majoritários e proporcionais), APÓS A POSSE quando se queixarão de “herança maldita” que caiu sobre seus colos e cabeças?

Quem está mais calado no momento?

Ora, aqueles que sabem que estarão fritos se o Eleito e o seu Ministro do Planejamento não forem cooptados como têm sido cooptados pelos que ficam em silêncio desde o II Império, e decidirem agir como Eleitos Legítimos e Independentes, visando apenas o interesse do país.

Note-se que se falou de um Ministro de Planejamento e não de Fazenda , que é um cargo que executa políticas e que, portanto, não pode a um só tempo planejar, executar, cobrar e avaliar tudo de uma só vez; sob o risco de nada fazer ou ser terceirizado por interesses políticos menores.

O Eleito e seu Ministro terão que dizer que o cobertor, além de esburacado é curto; mal cobre o tronco; e logo cobrirá apenas os olhos, como venda.

A Renda Nacional, gerada pelo Produto, deduzidas as despesas correntes e de capitais, deveria redundar no que se chama Renda Disponível: de pessoas (para consumir e poupar); de empresas (para pagar a depreciação do uso dos ativos e investir); de governos (para manter estruturas e alocar recursos para atender aos compromissos pactuados com a sociedade).

No âmbito tributário do Setor Público já se esgarçaram esses recursos tributados de forma indireta; a ponto de não ser possível mais APENAS arrecadar tributos incidentes sobre a produção e o consumo e a intermediação financeira: pois a inação do PIB “come” a renda a ser tributada.

As vozes contra a carestia vêm da ruas; os empresários que se somam a elas não dizem que a parcela dos impostos embutidos no que vendem aos consumidores são recolhidos por eles vários dias depois de encerrado o mês; e que os impostos que incidem sobre suas empresas, sobre a receita e o lucro líquido, fazem parte do preço que os consumidores pagam na boca do caixa.

Os senhores da intermediação financeira, que vociferam contra o aumento dos impostos indiretos, como o IOF e a CSLL, também não dizem que os incorporam aos seus produtos de crédito e nas tarifas de serviços e nas taxas de administração dos recursos que captam de seus depositantes e aplicadores.

Esse “alarido institucional” que irmana na aparência “todo mundo “ vai só até o ponto em que se busca tributar DIRETAMENTE também os lucros, os dividendos, os patrimônios herdados, a renda gerada pelo estoque de ativos (terras, imóveis), e daí por diante.

Por isso em outros países, onde as ondas de crescimento e progresso não cumprem os ciclos de 300 anos que acomete a economia brasileira desde 1.500, as empresas e bancos abrem o capital (para diluir com os sócios os encargos sobre a tributação direta, mantendo o mínimo para manter o controle acionário); usa-se o leasing ou o arrendamento comercial para pagar somente impostos sobre o Valor de Uso e não sobre o Valor de Posse dos ativos, e faz-se bom uso do instrumento criada pelos Imperadores Romanos e por rainhas e reis anglo saxões para financiar suas cátedras de ensino de , através do que se convencionou chamar de Fundos de Endowment ou Fundos Patrimoniais (onde se usam apenas os rendimentos do valor investido e não o seu valor de dotação inicial) para atividades nas áreas de educação em todos os níveis, saúde, habitação, cultura, esporte, lazer, em setores de interesse social, o que – na ponta final – desonera e abre margens para o Orçamento Público mais tradicional.

E quem contribui e porque esses fundos têm e respondem por tantos investimentos de natureza pública e social em outras partes do mundo?

Aqueles que para não renunciarem a seus ganhos tributados por Impostos Diretos e manterem a gestão direta ou indireta desses recursos, abrem Fundações ou diversas outras formas de organização societária sujeitas à fiscalização que dê transparência à destinação social desses recursos por parte dos Agentes Públicos (Receita Federal e Justiça Federal);

A alternativa?

Deixar o governo tributar e gastar da mesma forma e com o mesmo viés político, a alta tributação direta dos ganhos de capital que é assim arrecadada.

É isso o que tem levado os “super ricos” (a) ou se encastelarem ainda mais e apoiar regimes totalitários e oligárquicos; (b) se antecipar doando em vida parte expressiva de seu patrimônio pessoal e, para manter governança e regras de compliance (e agora o ESG), desses recursos, evitando que os mesmos sejam mal gastos ou sirvam a interesses que atendam à demandas emergentes de Governos e políticos transitórios e não de interesses de Estados permanentes a que todos pertencem e fazem parte igualitariamente.

Qual candidato hoje ou quando e se houver eleições teria a coragem de falar sobre essa realidade fiscal e sobre a possibilidade de se ampliar e generalizar o uso dos fundos patrimoniais?

Preço das Concessões: um novo teste de estresse?

Quando se faz a análise histórica das 04 (quatro) grandes fases em que se pode caracterizar a evolução das atividades de concessão no Brasil (vide http://blogconppp.com/?p=996), fica claro que cabe ao PREÇO DAS CONCESSÕES um papel fundamental para explicar os seus ciclos de ascensão e decadência.

O preço das concessões – que remunerou o capital investido pelos precursores da implantação green field, da primeira à última milha, das primeiras concessões nos tempos do II Império –, não resistiu ao início e à expansão do processo inflacionário causado pela alta dos juros e ao custo do capital de investimento da crise mundial financeira de 1891, ao impacto nos preços internos causado pelo aumento da massa salarial dos libertos e dos migrantes, e ao impacto dos preços por atacado, exportados e importados, devido ao fechamento do mercado exterior nas duas Grandes Guerra e na Crise de 29.

Ou seja, tanto o usuário das concessões sentia (sic) mais dificuldade em pagar o custos das tarifas dos bens e serviços concedidos, como a remuneração aferida pelos concessionários, no segundo ciclo, não era suficiente para o reinvestimento ou a manutenção adequada dos ativos concessionados. Assim, encampações de ativos ou a decretação de caducidade de contratos –preservando-se os direitos adquiridos, ressalte-se, contribuíam OU para justificar aumentos defasados (como no caso das revoltas dos bondes em lugares como Salvador, Rio de Janeiro ou Paulo) OU para a assunção de novos atores de investimentos (como nas assunções de plantas de geração de saneamento e energia).

No terceiro ciclo, no período de 1.950 a 2.000 – onde seja pelos requerimentos da fase de industrialização planejada, da criação de estímulos de capital, insumos e reservas de mercado demandada dos Agentes Públicos em apoio ao Setor Privado (aí incluindo a Teoria do Tripé Econômico, do III PND) –, com nova insurgência da inflação, um novo desajuste no preço real das tarifas se impôs.

E uma interferência marcante da Política Econômica da época – defasando o reajuste dos Preços Administrados das Tarifas Públicas, impedia (como nas duas fases anteriores das Concessões) que OU os novos Investimentos e Reinvestimentos demandados pelas concessões OU a adequado custeio da operação e manutenção dos ativos concessionados fosse realizada pelas empresas públicas (e poucas empresa privadas) que eram as principais detentoras do capital das empresas que respondiam pela qualidade da oferta de bens e serviços de infraestrutura do capital no país.

No atual primeiro quarto de tempo de um novo ciclo das concessões (do ano 2.000 a 2.050) – e após o resgate da estabilidade do Plano Real e do ajuste fiscal representado pela Lei de Responsabilidade Fiscal e de, pelo menos, metade dos 30 anos previstos para o resgate das obrigações de dívida pactuadas entre os entes federados para a busca do tão sonhado equilíbrio fiscal do país –, há uma situação de importante inflexão a ser analisada e enfrentada.

Se de um lado e até agora, a força dos contratos de concessão firmados têm resistido a situações bem definidas (como no desajuste cambial dos contratos de distribuição de energia, ou a iniciativas isoladas de ações populistas contra contratos nas áreas de transporte rodoviário ou do sistema viário urbano e até sobre os impactos fortuitos e de força maior de uma pandemia), resta avaliar a emergência de um possível novo “teste de estresse” a ser enfrentado nessa seara.

A necessidade de romper com, no mínimo, quase 10 anos (desde 2.013) de crescimento pífio – que só fez aprofundar desigualdades sobre todos os estratos de renda funcional da economia (pessoas, famílias e setores básicos e intermediários da produção e comercialização) e deprimir investimentos públicos e privados na economia –, por certo irá impor estratégias de recuperação de investimento, produção, emprego e renda voltadas a aumentar em termos nominais (a inflação poderá anular ou mascarar ganhos reais) a RENDA DISPONÍVEL dos variados agentes econômicos.

A busca por soluções (sic) de efeito rápido já exclui, de pronto, efeitos fiscais heroicos (como o a tributação de dividendos ou uma reforma fiscal que não seja adstrita à carga de tributação indireta, para acelerar o consumo de pessoas e de empresas): estas seriam propostas a serem costuradas no Congresso e que ainda precisam passar por princípios como a anualidade para sua implantação, o que, por baixo, (excluídas decisões extremas tipo confiscos ou empréstimos compulsórios sobre renda) só terá impacto a partir de 2.023 e 2.024.

Resta o velho arsenal dos juros que provoca mais contração, e – aqui está a questão, o mecanismos de preços.

Hoje – açulados e escaldados pelo paradigma dos preços do petróleo e seus derivados, indexados ao dólar – há a percepção crescente para os agentes políticos que (assim como o petróleo e seus derivados) há outros “preços protegidos” como a Energia, Águas e Esgoto, Transportes Urbanos, Pedágios, Fretes, e outros tantos que tem como “operadores” os agentes concessionários – como já foram os operadores estrangeiros e depois os públicos, nos outros Ciclos de Concessão anteriores ao atual.

E para os demais preços…há a concorrência, o mercado livre, os efeitos do clima, a flutuação cambial indireta…e a inelasticidade em dar-se mais prazo *estendendo a concessão ou vantagens fiscais como a postergação de arrecadação de tributos seja porque há barreiras corporativas para tanto, quanto necessidades de caixa para tocar o orçamento cada vez mais opaco e sujeito a tetos de gastos.

As “vozes das ruas”, como na França e países como a Argentina e o Chile nos anos recentes, é elemento ainda difuso a misturar essas cores da nova rodada pré-eleitoral.

Assim, a quase metade do quarto Ciclo das Concessões, promete um desafio que pode (sic) transcender o sempre necessário equilíbrio econômicos dos contratos sob a lógica apenas e eminentemente jurídico-contratual.

A exigência de se formarem fundos de estabilização com base na geração de caixa dos projetos novos e velhos (como hedge em segmentos onde o dólar ou os riscos de intempéries podem ser importantes) passa ser relevante. A menos que se aceite (sic) subfaturar preços de concessões como quando elas foram tocadas por capitais estrangeiro ou por capital público…

E, se possível – ironia e maldades à parte –, nas Matrizes de Risco entre o público e o privado, incorporar a, senão única, pelo menos a MAIS IMPORTANTE (e até agora intangível) das contrapartidas públicas para projetos de 30 ou até 60 ou 90 anos de prazo: manter a economia minimamente estável e fiscalmente equilibrada ao longo do tempo!!!

Os clusters setoriais das Concessões

Para minha surpresa, não todos – mas uma grande parte daquelas pessoas com quem eu havia conversado sobre as dimensões das atividades das Concessões Públicas (http://blogconppp.com/?p=1002) e sobre os 04 Ciclos das Concessões no Brasil (http://blogconppp.com/?p=996) – voltaram a me procurar para uma “repescagem” dos assentos tratados e para que eu lhes explicasse o que eu quis dizer sobre os tais CLUSTERS SETORIAIS nesse mesmo contexto.

Comecei a lhes chamar a atenção para o fato de que, para o grande público, através das notícias e dos comentários de TV ou na Internet, geralmente se fala mais dos aspectos MACROECONÔMICOS do que dos aspectos MICROECONÔMICOS das Concessões.

Por exemplo: já se sabe que países como o nosso, precisam destinar entre 3% e 5% do seu Produto Interno Bruto (PIB) para realizar investimentos na infraestrutura econômica – por prazos entre 10 anos e 20 anos – para que eventuais lacunas ou falta de manutenção ou ampliação e modernização desses ativos de infraestrutura não criem o que se chama de aumento no “Custo País”.

Também já é comum se referir a grandes números que os investimentos em infraestrutura (feitas diretamente pelos Governos ou através das concessões) geram para o país: tais como o aumento da Formação Bruta de Capital Fixo em relação ao PIB.

Mas, para explicar os tais CLUSTERS, vamos acrescentar à essas duas dimensões, outras duas, para dar uma noção melhor do que pretendemos definir mais adiante, como as repercussões Espaciais e Setoriais: afinal, “o que” se faz se faz em “algum lugar” e em algum setor específico de atividade.

Uma analogia e um caso específico talvez ajudem a deixar mais claro o que se quer dizer com tudo isso:

A analogia será “tomada emprestada” de um jargão utilizado em alguns projetos de infraestrutura sob concessão (das concessões de TELECOM e de outras concessões como as de mobilidade urbana, energia, entre outras): a noção de Primeira Milha, Milhas Intermediárias e Última Milha:

Qualquer investimento (em infraestrutura, via Governo ou via Concessão), em geral possui esses 03 (três) componentes ou etapas: o ponto inicial de geração da oferta e do uso do bem ou produto provido, passando por fases ou etapas de distribuição ao longo do trecho onde se distribui e despacho o que é gerado no ponto inicial; e, por fim, o ponto de chegada ou de destino final do que se gerou desde o início do processo do bem ou serviço que é ofertado.

Se pensarmos desde a origem das concessões no Brasil, no primeiro dos quatro ciclos de 50 anos cada que tivemos no país até agora – vide o texto já citado (http://blogconppp.com/?p=996) –ou seja, no Ciclo dos 50 anos do II Império –, as primeiras concessões eram TODAS ELAS criadas do zero: as ferrovias, os portos, o esgotamento sanitário, a iluminação pública, a cabotagem, os projetos na área de energia, e daí por diante.

Sua repercussões eram não apenas macro (entravam as divisas dos investimentos diretos feitos pelo capital estrangeiro que financiou as mesmas de modo preponderante nesse primeiro ciclo). Mas, houve repercussões microeconômicas extremamente relevantes: novos setores e empregos foram gerados em outros setores que não apenas os dois grandes setores até então que eram a produção agrícola, o Comércio Importador e as atividades de governo e de serviços de apoio às atividades básicas. E, também, impactos regionais dessas atividades, uma vez que as mesmas se fizeram em TODAS as principais províncias do país de então, consolidando as economias regionais e a elas acrescentando sua margem de contribuição ao crescimento, produtividade e economia s internas e externas por elas geradas.

O caso da Iluminação Pública (IP), ao longo do tempo, é bastante elucidativo.

Para se implantar a primeira Concessão de IP – de 1850 até 1875 – foi preciso MUDAR o processo e a FORMA da atividade até então prevalecente: sair do USO de gorduras e óleos de origem animal e vegetal como fonte de iluminação PONTO A PONTO para um processo em que se passou a utilizar o gás hidrogenado de carbono, derivado da queima do carvão para iluminar remotamente os Pontos de Luz determinados pela Concessão: exatos 3.027 postes de iluminação ( a rede de IP de Iluminação de então, a RIP).

Para isso, foi preciso criar uma INDÚSTRIA DE QUEIMA DO CARVÃO – os Gasômetros – e desenvolver atividades de fundição e de pequena metalurgia num contexto em que os grandes setores de atividades existentes eram a Atividade Exportadora de produtos minerais e agrícolas, o Comercio Importador e Exportador e as atividades de apoio do Governo e de serviços em geral.

Ou seja, mudou a MATRIZ DE EMPREGO E RENDA nas províncias do Rio de Janeiro (capital), São Paulo e em outras capitais onde se criaram os Gasômetros.
Nos dias de hoje, com as plantas das concessões de energia consolidadas a partir de suas formas de energia limpa e renovável, o impacto dos projetos de IP também se modificou.

Existem os mesmos efeitos macro, micro, setoriais e espaciais já levantados (e que são comuns a todos os projetos de infraestrutura): surgiram plantas industriais para atender a todo o ciclo de geração de atividades que VEM ANTES e que VEM DEPOIS que as diferentes formas de energia são geradas e disponibilizadas no GRANDE SISTEMA INTERLIGADO que abastece de energia os consumidores individuais e empresariais de energia: e, no caso em particular da IP, o Governo das cidades que se constitui no Poder Concedente.

Pulando (sic) do primeiro para o atual QUARTO CICLO das Concessões no Brasil, a atividade de IP se transformou radicalmente: as grandes empresas de energia que provisionavam tanto a geração como a transmissão e a distribuição de energia foram todas segmentadas e tiveram seu controle acionário (em sua quase totalidade) concessionadas para o capital privado estrangeiro ou nacional.

E, assim, às atuais empresas distribuidoras – a quem cabe a oferta de serviços de IP hoje em dia – são um cliente importante das geradoras e das transmissoras de energia.

Ao CLIENTE FINAL da IP (as Prefeituras das cidades brasileiras) cabe “cobrar” pelo uso da energia nas residências e nas empresas para criara um seeking funding através das chamadas contribuições para pagamento de energia elétrica (COSPI ou CIP) que proverão a liquidez para pagamento dos custos de manutenção dos serviços públicos de iluminação.

De 05 em 05 anos, há que se relicitar esses contratos com as distribuidoras regionais e não podem exercer o poder de compra apesar de serem os ÚNICOS e os MAIORES consumidores individuais de energia para um fim específico (a Iluminação Pública), OU porque os ofertantes de energia de outros pontos do país temem correr o “risco governo” – ainda que por estarem aportadas num FUNDO DE ILUMINAÇÃO com CNPJ diferente das prefeituras e por serem fiéis depositários dos recursos que tiram compulsoriamente via COSIP/CIP dos consumidores residenciais e não residenciais de toda a ordem – OU porque preferem correr o risco privado das distribuidoras privadas OU porque foi definido assim nos Editais de Concessão das distribuidoras.

Também se deve partir do princípio de que as Distribuidoras Concessionadas exercerão a certificação de produção dos bens e serviços de CAPEX e OPEX que influenciam a oferta de energia visando sempre o melhor e menor preço ao consumidor final, no que serão de perto acompanhados pelos órgãos de controle externo do único e maior comprador de IP (o Governo) e pelo Papel Institucional indelegável da Agência Reguladora que rege o setor elétrico.

Fato é que neste 4º Ciclos de Concessões a atividade de IP apresenta um espectro de ramificações e influência que pode ser depreendido a partir do quadro a seguir:

Ou seja, uma das concessões mais antigas (a de IP) permite observar que vistas de modo amplo, a ATIVIDADE FINAL de concessão depende e gera uma enorme cadeia (ou CLUSTER) de atividades que se ligam e interligam e que terão reflexos regionais e setoriais além dos efeitos micro e macroeconômicos a que estão sujeitas.
Por isso as concessões hão de ser abordadas em seus complexos estruturados (CLUSTERS SETORIAIS): sejam os complexos de mobilidade urbana, de energia de saúde, de iluminação pública, de transportes aero marítimos ou rodo ferroviários, e daí por diante.

Porque o custo, a produtividade, a liquidez e a sua produtividade requerem que não apenas a ATIVIDADE FINAL, mas TODAS AS ATIVIDADES que lhes são antecedentes ou consequentes estejam dimensionadas para bem sustentar a expectativa de seus resultados.

As diversas dimensões das Concessões Públicas

Dia desses, conversando sobre o tema das Concessões Públicas com pessoas que questionavam o porquê de tanta ênfase a essas atividades no contexto das políticas públicas, percebi que apesar do tanto que se fala sobre as Concessões, poucos se dão conta do quanto que estamos envolvidos no que se poderia chamar de “O Mundo das Concessões”.

Parece nome de documentário do National Geographic ou de outro programa de canal de TV sob assinatura: ou até nome de aula nos canais de Supletivo ou de Educação.

Mas, na verdade, a amplitude que envolve essa discussão que tem menos de 30 anos no debate mais recente — embora em artigo anterior (Os 04 Ciclos de Concessões no Brasil”, in Academia.edu, no link https://www.academia.edu/69069443/) tenhamos mostrado que a discussão remonta a mais de 200 anos só no Brasil –-, pode-se dizer que pela evolução do assunto se pode explicar muito das transformações que o país tem experimentado na sua matriz econômica nesta sua atribulada existência.

É como se pudéssemos pensar em uma disciplina como “Economia Política das Concessões”.

Exagero?

Então vamos especular um pouco essas nuances ou dimensões todas que estão subjacentes quando se fala sobre as Concessões nesses quase 200 anos na história mais recente do país.

Ao grupo de pessoas a que me referi antes, mostrei o slide a seguir, onde se destacam as imagens do Bondinho do Pão de Açúcar (RJ), do Elevador Lacerda (BA), do Parque Trianon (SP), ou do Zoológico do Rio de Janeiro (RJ).

Custou àquelas pessoas acreditarem, num primeiro momento, que em diferentes épocas, que estes locais que para elas estão associadas a atividades de lazer ou de entretenimento, pudessem ser objeto de concessões por diferentes motivos: ligar dois planos de uma cidade (a Cidade Baixa à Cidade Alta) para assegurar o transporte público de pessoas em coches puxados por cavalos ou muares, em pleno século XIX, por exemplo, como foi o caso da concessão dos antigos ônibus em Salvador. Ou que os Parques Urbanos como o Trianon e o Ibirapuera em São Paulo, ou os parques Zoológicos do Rio de Janeiro e de São Paulo fossem hoje geridos por concessionários privados. Ou que o conhecido Bondinho do Pão de Açúcar tivesse sua permissão de uso autorizada na origem pelo Imperador Pedro II.

Poderia ter falado de muitos outros exemplos, mas aí resolvi fazer uma brincadeira: perguntei a cada uma das pessoas o que costumava fazer após se levantar todos os dias para começar a sua rotina semanal.

E, para cada uma das atividades descritas, chamei a atenção para o fato de que TODAS ELAS estavam associadas a algum tipo de Concessão Pública!

A brincadeira foi até o ponto em que algumas delas chegaram a perguntar: ”Mas, afinal, o que NÃO É concessão pública”?

Na verdade, houve até quem “filosofasse” ao dizer que…”afinal, a Vida não é ela mesmo uma concessão transcendental?”

Bom, mas a verdade é que essa percepção é muito mais ampla do que se pode imaginar: afinal, as diversas formas de Concessão Pública – do latim concessio que quer dizer “cessão por prazo, preço e condições definidas que ao seu término volta á posse a ao domínio de quem concedeu algo ou alguma coisa a terceiros”—, tem origem na época feudal, onde o Senhores eram o Poder Concedente para exploração de suas terras e domínios, sob a forma de cessão de uso, arrendamento, meação…E que até cobravam impostos e taxas para os seus parceiros (mesmo não sendo “governos”)…E que é daí que se evolui para a organização de diversos Senhores que sustentavam os Estados Nacionais que se expandiram em busca de terras e possessões no além-mar (pois a riqueza, a produção, a renda, as riquezas e poder vinha da terra, o fator primário de produção).

Assim, se aliarmos essas “concessões privadas” que foram a origem das concessões públicas, e que evoluíram para as novas formas privadas de concessão como as franquias, as licenças de uso, os arredamentos e por aí vai, até parece que somos todos uma GRANDE ILHA DE CONSUMIDORES de bens e serviços cercados de CONCESSÕES E CONCESSIONÁRIOS por todos os lados…

E, poderíamos ainda emendar: que “tipos” de consumidores para que “tipos” de produtos?

De início é importante perceber que cada produto ou serviço concessionado possui uma UNIDADE DE MEDIDA em que é expresso ou denominado:

E se existe uma UNDIDADE DE MEDIDA e se existe quem demande essas unidades, em quantidades e para uso tão diferentes, também existem MERCADOS específicos que podem ser estudados em suas especificidades para que se verifique “quê” tipos de estruturação de atividades, negociações, formas de custeio e investimento (entre tantas outras qualificações) podem ser utilizadas para o melhor desenvolvimento desses vários “Mercados de Concessão”.

Mais especificamente, é importante perceber que um MESMO PRODUTO OU SERVIÇO CONCESSIONADO pode atender tanto ao CONSUMO INDIVIDUAL de uma pessoa, quanto o CONSUMO EMPRESARIAL de um agente que se organiza para ofererecer seu serviço para a sociedade.

Como assim?

Cada um desses produtos ou serviços concessionados denominados no slide anterior, pode ter um uso enquanto BEM DE CONSUMO INDIVIDAUL como BEM OU INSUMO BÁSICO OU INTERMEDIÁRIO para a produção e outros bens e serviços.

A ENERGIA ou a ÁGUA, por exemplo: atendem demanda básica, essencial, de pessoas para sua sobrevivência e reprodução: mas, para certas empresas – como as que usam a ÁGUA ou a ENERGIA para produzir bens ou serviços finais ou para movimentar suas máquinas e equipamentos, são elementos primordiais às suas atividades:

Assim, precisamos de água e energia e a compramos à vista, pagando por seu uso mensalmente: nós e milhões de outros consumidores individuais.

Já para as empresas produtoras de bens e de serviços, CADA AUMENTO DE CONSUMO deve ser planejado e comprado em grandes lotes, a prazo (ou a termo): e contratado com os Concessionários que oferecem suas oferta, por delegação do Poder Concedente desses bens e serviços.

O que é BEM DE CONSUMO para um é INSUMO para outros: em quaisquer dos outros produtos e serviços destacados: possuem NECESSIDADE CONTÍNUA o que torna a sua ESSENCIALIDADE uma fonte importante para levantamento de recursos necessários para a sua oferta; antecipadamente, para atendimento das necessidades dos seus usuários ao longo do tempo.

Ou seja, são itens que no MERCADO À VISTA ou no MERCADO DE FUTUROS possuem ou têm atratividade para que seus ofertantes tenham a acesso a recursos não-financeiros (ou que não gravam patrimônio ou o endividamento das empresas) para a realização de investimentos necessários para o aumento contínuo de sua oferta à população e ao mercado.

Bem, eu estava para demonstrar como cada uma dessas atividades gera transformações profundas na economias dos países como o Brasil – através dos vários CLUSTERS SETORIAIS que todos eles acabam por resultar, quando percebi a cara de paisagem criada por essa overdose de informações…

Assim, pedi que eles pensassem sobre o papel e a influência das CONCESSÕES PÚBLICAS em seu dia a dia, no que fui entusiasticamente saudado (menos por qualquer mérito do que pelo nó que causei na cabeça daquelas pessoas).

Ficamos de nos encontrar para falar do tal efeito matricial (…) das concessões!

Se eles voltarem, prometo escrever sobre “como foi” essa conversa, em outra oportunidade.

Saudações concessionadas!!!

Os 04 (quatro) ciclos das Concessões no Brasil

A aprovação dos novos marcos regulatórios do Saneamento Básico e das Ferrovias no ano passado, foi destacado pela imprensa e por analistas como um fato histórico auspicioso.

Primeiro, por significar que “após mais de 100 anos” o setor Privado voltava a investir na expansão da malha ferroviária que, apesar das dimensões continentais do país, responde por algo em torno de 20% do volume de cargas movimentada pela sua Matriz Intermodal de Transportes: de fato, de seis a oito empresas vão fazer um investimento “green field” – da primeira à última milha, isto é, dos projetos à compra e assentamento dos dormentes e trilhos, estações de transbordo de cargas, materiais e pessoas, compra de locomotivas e operação, manutenção e reinvestimento da malha, além da integração com a malha já existente.

Segundo porque, no caso do Saneamento Básico, o novo referencial permitirá que mais de 50% das cidades brasileiras tenha, por fim, acesso à produção de Águas e à coleta de Esgotos e Resíduos Sólidos, o que impacta diretamente a qualidade de vida, a saúde, o aprendizado e até a produtividade do trabalho a médio e longo prazos, já decorridos quase ¼ do Século XXI, que marca a passagem para a decantada Economia 4.0!

Para quem tem como Marco Temporal das Concessões a aprovação dos diplomas legais das Lei Geral das Concessões, a Lei 8.987 de 1995 e a legislação que incluiu as Concessões Administrativas e Patrocinadas, sob é égide das chamadas Parcerias Público Privadas (PPP), a Lei 11.079 de 2004, a introdução do “vetor temporal secular” causou certa admiração.

Na verdade, a expansão das Concessões de todo o tipo após os referidos diplomas legais, significou, em boa medida, a assunção de plantas de concessão já existentes na economia brasileira, assim como a realização de investimentos que poderíamos chamar de “brown field”, nas etapas de “última milha ou de milhas intermediárias” em ativos já existentes em vários segmentos da economia, como as rodovias, os ativos de geração-transmissão-distribuição de energia elétrica e do gás, as redes de Águas e Esgoto, as malhas de transporte urbano de massa (dos ônibus e dos trens urbanos, chegando às linhas dos metrôs), a transmissão de voz-dados e imagens das plantas de telecomunicações, os portos e as ferrovias e os investimentos na infraestrutura urbana e social (nas áreas de Saúde, Educação, Sistema Viário e, por extensão, também em parques e áreas urbanas ociosas, entre outros).

A maturação das concessões a partir desse período mais recente, entretanto, ainda se ressente de amadurecimento em alguns vetores como a bilhetagem de serviços em áreas como a energia ou Águas e Esgoto e Gás, que ainda se faz “door to door”, tal como se cobrassem pela venda de cosméticos ou utensílios de uso doméstico (quando e se é feita a devida “leitura presencial”); ou a forma estéril de financiar ativos, desconsiderando o valor intrínseco do “produtos ou serviços de concessão” (para uso individual ou empresarial), embora o BNDES em boa hora pareça estar mudando o cenário das grotescas garantias corporativas para financiar ciclos de produtos com alta essencialidade e retorno como são os produtos e serviços gerados sob a forma de concessão.

Porém, sob uma perspectiva temporal mais adequada, as atividades de Concessão explicam (sic) boa parte da formação econômica do Brasil (aliás, em termos funcionais, uma Concessão da Estado Nacional Português, enquanto colônia de Portugal).

Sob este enfoque, a Economia Política das Concessões, no presente, encontra-se no que se poderia chamar de 4º Ciclo das Concessões no Brasil:

Nos 50 anos do II Império, as Concessões de deram num momento em que a Economia Mundial passava para a sua Fase 2.0 (após a Revolução Industrial 1.0, acontecida a partir de 1776), com a introdução de inovações como o vapor, a energia elétrica, os Caminhos de Ferro, o telégrafo e o telefone e outras invenções e inovações que mudaram o perfil da produção, a renda e do emprego estrutural.

Atento às mudanças da época, o Imperador fomentou a atração de investimentos diretos estrangeiros – que se juntaram a capitais privados nacionais acumulados, seja pelo tráfico de escravos, pela renda do setor primário exportador formado nos ciclos coloniais (do açúcar, do algodão, do cacau, dos minérios e do ouro, entre outros), seja pelos capitais oriundos do Comércio Importador da época –, para financiar o 1º Ciclo de Concessões no país, que cobriu das Ferrovias aos Portos, passando pelas Comunicações (cabos submarinos com a Europa e EUA e telefonia), a Energia das Quedas D’água, transportes urbanos de massa (bondes), Navegação de Cabotagem e até a (hoje tão em moda) Iluminação Pública.

A característica maior, é que eram TODOS investimentos “green field”, da “1ª à última milha”, ou seja: nas ferrovias, do atração dos investimentos diretos à importação dos trilhos e do carvão até a importação das locomotivas, dos dormentes, a construção física das malhas ferroviárias, passando pela construção das Estações e da implantação das linhas. Na Iluminação Pública, da geração da energia primária (do gás de hidrogênio carbonado) através das construção dos Gasômetros que processavam o carvão importado, passando pelas fundição de tubos e luminárias até a última milha dos lampiões a gás.

No 2º Ciclo (nos 50 anos da República Velha até 1950), a crise financeira que começou em 1891 e foi o embrião da Crise de 29, além da eclosão de duas Guerras Mundiais, “fechou” a geração de riquezas dos produtores do agronegócio de então, a par dos seus efeitos sobre o Comércio Importador. E – com a monetização do trabalho até então escravo e o pagamento dos imigrantes que, desempregados pela Economia 2.0 viera, vieram a se empregar extensivamente nas produções de agro produtos de exportação, fez aparecer a erosão dos preços relativos (inflação) e defasou as tarifas públicas cobradas pelos concessionários das concessões de então. Revoltas como a dos carroceiros (em protesto ao avanço dos bondes) e sobre o preço dos transportes, posteriormente, levaram à decretação da caducidade de várias concessões.

Entre elas a de Esgotamento Sanitário (sim o Brasil do II Império foi o terceiro pais do mundo a ter um Projeto de Saneamento Básico ainda em 1863 via esgotamento sanitário (atrás apenas de Londres (UK) e Hamburgo, na Alemanha), através da “The Rio de Janeiro Improvement and Company”, ex-CEDAE, privatizada em 2021 e neste início de 2022), que no 2º Ciclo das Concessões foi estatizada pelo primeiro Governo Vargas.

Já no que poderíamos chamar de 3º Ciclo de Concessões (de 1950 até o ano 2000), com a Economia Mundial passando para sua fase 3.0, com a automação de produtos e processos de produção e de prestação de serviços, entre outras mudanças fundamentais na linha de frente e na retaguarda das atividades econômicas, veio um período impactado pelos efeitos da reconstrução mundial gerada pelo fim da 2ª Guerra, onde a ação de um Estado indutor de progresso e desenvolvimento ocupou as ações de vários governos. E, em países como o Brasil redundou num papel onde via crédito e finanças públicas ou via a intervenção direta de empresas estatais se produziriam os produtos, insumos e serviços necessários para consolidar o papel dos agentes privados nacionais e estrangeiros na oferta de bens e produtos industriais, importantes para a geração de produtos, renda, emprego e arrecadação para manutenção de empresas públicas (sob a doutrina do chamado Tripé Econômico entre empresas Estatais, Privadas Nacionais e Privadas Estrangeiras para a consolidação de uma economia resistentes até às oscilações cíclicas da encomia externa, (na época fraturada pela alta do petróleo e das taxas de juros internacionais, até do Banco Mundial e do FMI).

Assim como correu na passagem do 1º para o 2º Ciclos, os impactos externos causaram a defasagem tarifária que, mais uma vez, erodiu e defasou o preço de investir, operar, manter e reinvestir nas economias concessionadas. E o resultado, como corolário de um profundo ajuste do Setor Público no início do ano 2000 (no 4º e atual Ciclo de Concessões, com a Economia Mundial em nova fase de mudanças, agora em sua Versão 4.0), abriu uma nova fase de expectativas quanto ao futuro das economias concessionadas.

Sim: o PREÇO foi sempre o vilão das crises da economia e da atividade concessionada até aqui.

Hoje, como dito de início, há a convergência da necessidade de investimentos “green field” da primeira à ultima milha (como no caso dos investimentos em ferrovias e no saneamento básico e vários outros) e na modernização e adequação de investimentos concessionados assumidos na fase de transição entre o 3º e o 4º Ciclos de Concessões (em áreas como bilhetagem e estrutura de capitais e investimentos), num momento de agrura fiscal crônica causada pela pandemia (mundial) e pela falta de perspectivas e de planejamento da saída (nacional) onde uma REFORMA TRIBUTÁRIA continua a ser a maior necessidade – a rigor, desde o 2º Ciclo de Concessões, pelo menos.

Mais uma vez as Concessões terão por certo um papel inarredável neste contexto: resta saber se haverá serenidade e visão prospectiva para permitir a retomada do crescimento e da urgente redução das desigualdades que atrasam e constrangem o desenvolvimento do país.

Complexo Econômico Industrial da Saúde (CEIS) e as Concessões e PPP

Vários autores – entre eles, Gustavo Noronha & Daniel Negreiros e Monica de Bolle – têm desenvolvido textos e sugestões importantes sobre a oportunidade – assim como fizeram China, Índia e Rússia – de aproveitar o impacto da pandemia da COVID 19 para estruturar (modernizando e evoluindo) suas estruturas funcionais s=e econômicas do Setor da Saúde.

(Essas referências podem ser encontradas na Revista Brasileira de Planejamento e Orçamento, RBPO – no caso do artigo de Noronha & Negreiros) e no Jornal El País, de 08/02/2021, na coluna de Monica de Bolle, onde há menção do trabalho mais encorpado realizado no Peterson Institute sobre o mesmo assunto).

Comentando o artigo de Noronha & Negreiros – que apresenta os efeitos das intervenções, permiti-me fazer a extensão que apresento a seguir.

Imaginava que com a estruturação das PPP da Saúde em nosso país, esse fantástico cluster (que agrega P&D, produção de medicamentos e insumos, prestação de serviços, atividades de prestação de serviços de bata branca e bata cinza, laboratórios, além de atividades que lhes são complementares e/ou antecedentes como financiamentos e investimentos, seguros, inovações, entre tantos outros), atraísse o interesse dos formuladores de políticas públicas, permitindo que se alterasse a matriz de financiamento da formação de ativos de infraestrutura social econômica.

Afinal, como todo setor que apresenta grande nível de relacionamento intra ou intersetorial, os ativos de infraestrutura possuem uma atratividade ímpar para a formação de capital: notadamente onde há demanda reprimida seja por novos investimentos (green field) ou para a expansão ou retrofit de investimentos (brown field) ou, ainda, para a formação e introdução de novos produtos e processos de produção e prestação de serviços (newest field).

Mas, assim como nas demais clusters de infraestrutura tarifada (energia, saneamento básico, telecomunicações, transporte aero-rodo-metro-ferroviário, entre outros) e de infraestrutura não-tarifada (como são os ativos formados no campo social e urbano, de saúde, P&D, ativos viários, entre outros ), prevalece a matriz de financiamentos calcada no mercado de dívidas, com remuneração de juros reais (financiamentos e debêntures de infraestrutura) em detrimento das alternativas existentes no mercado de futuros, de risco e de capitais.

Neste sentido, é oportuno destacar que a criação e a operação e manutenção de ativos de infraestrutura – excetuadas as obras de emergência ou calamidade realizadas pelas forças armadas em situações específicas –, é o setor privado que costuma estar à frente da execução, operação e manutenção desses ativos.

E que, neste sentido, a estruturação do CEIS, enquanto resultante de política pública de saúde como ressaltado nos artigos e nos textos citados, oferece uma ampla possibilidade de apoio via os mercados de futuros, de risco primário (equity) e de risco secundário (mercado de capitais), sem contar a contribuição acessória dos mercados de dívida (empréstimos e financiamentos) e das operações estruturadas de PPP e Concessões.

Algumas dessas possibilidades são apresentadas no quadro a seguir, onde se mostra a pluralidade de instrumentos existentes para servir de lastro contratual e de apoio às atividades que podem servir de base à criação de fundos para alavancar a formação de diversos produtos e serviços que constituem o amplo espectro de atividades do tão pertinente quanto bem-vindo CEIS.

Note-se por exemplo, que a COMPRA ANTECIPADA de vacinas – lastreada por um contrato de FORNECIMENTO firmado entre Governos dos países mais desenvolvidos com as empresas farmacêuticas mundiais serve TANTO para a securitização antecipada de riscos e a captação de recursos por tranches para custear cada etapa do evolução de processo de seu desenvolvimento, QUANTO para fundear junto aos acionistas dessas empresas (sua Tesouraria ou via a valorização de suas ações em Bolsa de Valores), o levantamento dos recursos que serão necessários para a cobertura desse processo de geração de valor.

Neste ponto é necessário relevar que, diferentemente dos países mais avançados – e devido aos esforços decenais de controle do déficit públicos, desde o período 1980/1990 e depois do ano 2000, com a Lei Complementar que institui a Lei de Responsabilidade Fiscal – o setor público que executa políticas públicas nos campos da infraestrutura não tarifada (como a saúde), não pode ser financiado diretamente pelo sistema de dívidas ou pelo sistema de captação de recursos a futuro ou de risco primário e secundário, mercê de seus limites de endividamento e dação em garantia, previstos pela LRF.

Assim, talvez as demandas originárias a serem efetivadas a partir do enfoque de uma Política Pública que se configure como Política de Estado – a ser implementada e ajustada por gerações até a sua efetiva maturação e consolidação – possam admitir que os FLUXOS DE PAGAMENTO para a formação de ativos OU para a sustentação das suas necessidades de operação e manutenção dos ativos que forem formados a partir da configuração das CEIS, possam ser CERTIFICADAS e, assim, possam ser consideradas para a realização de operações finais ou subsidiárias para a sustentação demandadas para a implantação e maturação e a consolidação das CEIS.

Algumas dessas operações são apresentadas no quadro exposto: outras tantas, poderiam ser a ele agregadas de forma a constituir e configurar todos um SISTEMA DE SUSTENTAÇÂO, que pode ser importante para num horizonte de tempo razoável – de 10 a 20 anos – se possa ter um SISTEMA DE SAUDE moderno e eficaz para permitir o melhor enfrentamento de situações como as vividas pela disseminação da pandemia da COVID 19.

E possa também se constituir em um MODELO INTEGRADO de atuação para consolidar os vários segmentos de infraestrutura tarifada e não tarifada que – assim como a Saúde – ainda possuem como característica primária a existência de vastos e desiguais segmentos da população que não têm ainda atendidas suas necessidades básicas de bem-estar e cidadania.

O preço? Ora o preço…

As discussões sobre a privatização da ELETROBRÁS me fizeram relembrar um episódio.

Quando trabalhei em uma empresa estadual de energia, recebi um empresário que foi me comunicar a intenção de fazer uma proposta para adquirir uma usina da empresa, pagando por ela apenas o que entendia ser o seu “efetivo valor”: o valor residual que estimou em 4,4 % do valor inscrito no seu (empresa) balanço patrimonial.

Dizia que o CAPEX já havia sido totalmente amortizado e, como tal, seria quase que um “prêmio mais do que justo” a pagar aos acionistas da empresa (governo estadual, acionistas individuais e institucionais) por 100% do valor daquela usina em particular..

Lembrei que eu não podia vender no todo ou em parte o que pertencia ao Poder Concedente (a União, e não o Estado) já que SEMPRE, independente de quem tem a titularidade da empresa, pública ou privada, ou seja, o “dono da empresa” remanesce a Concessão no domínio do Poder Concedente. E que até a venda da empresa estadual ou de uma usina – com a devida anuência do Poder Concedente – deveria passar por autorização da Assembleia Legislativa, dos órgãos do controle do Estado, de Assembleia dos Acionistas…) enfiam, que “vender” não era ato discricionário de quem respondia pela direção da empresa, simplesmente.

Ademais, àquela época, ainda não existia a Nova Lei de Concessões Públicas (a Lei 8.987), ou a Lei das PPP (a Lei 11.097) mas havia um Plano de Privatização conduzido pelo BNDES desde 1990 e por certo haveria um Plano Estadual para normatizar essas eventuais tratativas: o interessado saiu inconformado e disse que iria tomar suas providências face à minha recusa, eis que já teria “decidido” seu intento com a autoridade máxima do Estado…

O objeto de tal desejo era “apenas” uma usina histórica de uma empresa também “histórica” – equivalente à ELETROBRÁS – e igualmente importante para a economia do país e do Estado.

Por outro lado, foram os “próprios empresários privados” que 03 (três) décadas antes PEDIRAM ao Governo do Estado que aglutinasse as várias empresas privadas e estrangeiras de energia então existentes – SEM QUALQUER CAPACIDADE DE INVESTIMENTO – em UMA ÚNICA EMPRESA PÚBLICA ESTATAL, de sorte a fazer face ao crescimento de MAIS DE DOIS DÍGITOS ANUAIS que a demanda por energia reclamava na época do então milagre econômico brasileiro.

Com a anuência do Poder Concedente, os acionistas privados brindaram “à justa paga” e comemoraram a possibilidade de crescer com a economia milagreira (sic) sem sofrer limitações da sua fronteira de energia.

Passadas as três décadas, o que se dizia é que a empresa estatal estadual NÃO INVESTIA na medida da necessidade reclamada pelo empresariado pondo em risco a economia das empresas eletrointensivas no Estado.

Afinal era uma empresa histórica com boa parte das suas usinas já amortizadas…

Não havia o investimento por duas razões simples:

01. O governo federal não autorizava o Poder Concedente a sequer repor o impacto da inflação nas tarifas das empresa federais (como a Eletrobrás) ou estaduais, para “segurar” o repasse aos preços e controlar o índice de inflação do país…Tal como corria com todas as tarifas públicas, o que contraía a capacidade de investir e a capacidade de manter e sustentar a operação de várias outras “utilidades” como a as tarifas de águas e esgoto, tarifas de comunicações, tarifas aeroportuárias, tarifas de transportes públicos, tarifas de pedágios rodovias e daí por diante… e,

02. SEM PREÇO, não se investe no que mais se precisa nas empresas – principalmente as históricas – que é, no mínimo, a repotencialização das turbinas, a automação de processos de operação para compensar a curva de obsolescência de velhas tecnologias e o ponto de rendimentos decrescentes da potencialização, e daí por diante.

Sem falar na necessidade de reciclagem da mão de obra, treinamento e reposicionamento estratégico face a novos cenários como o surgimento de fontes alternativas de geração e conservação de energia.

Além do que, não se estima o valor de qualquer negócio “olhando para trás”: estimados os investimentos para atualizar e/ou manter atualizado e competitivo o valor das usinas e da empresa, histórica ou não; estimados os seus custos futuros de manutenção, operação e constante atualização tecnológica, estima-se o valor de crescimento e manutenção de sua base de clientes e as suas possibilidades de expansão e, assim, se chega ao Valor Presente do Investimento, o prazo de recuperação do capital e a Taxa Interna de Retorno do negócio. Confrontado com o custo de oportunidade do capital próprio e de terceiros que se mobilizará e as oportunidade de alavancagem do projeto, aí se toma a decisão de investir (ou não).

Mas nada – ressalte-se NADA – pode abstrair o PREÇO DA TARIFA que, se não for corrigida, para assegurar o retorno do capital e a sustentação do esforço de manutenção da operação, afastará o investidor ou forçará a revisão contratual e pode implicar até na caducidade antecipada do empreendimento pelo Poder Concedente.

Outro ponto a observar é o efeito conjugado da forma de financiar a produção e o investimento das empresas de energia privatizadas e o efeito de trade-off que a interligação do Sistema Elétrico e a progressiva maturação de eventos como o surgimento de novas fontes de energia ou da propagação de energia distribuída, podem ter sobre a formação de preços do novo negócio (atopetado de jabutis) para a formação do preço final da energia a ser oferecida ao mercado.

Ou seja, tudo indica que – tal como aconteceu com a economia 1.0,2.0,3.0, 4.0 e 5.0 –, o Mercado de Energia terá um novo período de “Golden Age” pela frente.

Nunca (ressalte-se NUNCA) nenhum dos períodos de expansão da economia pôde prescindir da ENERGIA como fator propulsor dos ciclos virtuosos e das grandes transformações estruturais da produção, emprego e renda que o mundo observa desde a I Revolução Industrial.

Quanto maior a automação e menor a intervenção humana em produtos e processos, maior a necessidade da energia em todas as suas formas (afetando TODOS os setores de produção, e até mesmo o transporte público de massa ou a indústria de prestação de serviços de infraestrutura em geral).

Precificados todos os jabutis da aprovação a qualquer custo da ELETROBRÁS, o preço da energia final para os eventuais compradores da empresa como UM TODO ou através do FATIAMENTO REGIONAL de suas empresas originais, será tão proibitivo para o comprador que de duas, uma:

a. O novo comprador é um visionário (sic) que JÁ CONTA com um seguro garantia (sic) para que tal deformidade na formação de preços seja SOCIALIZADA com todos os consumidores COMERCIAIS E INDUSTRIAIS e INDIVIDUAIS da energia a ser gerada, sublimando também a independência das Agências Reguladoras Nacionais e Estaduais envolvidas, ou,

b. Os consumidores – pessoa física e pessoa jurídica – que serão diretamente afetados por essa formação de preços vil OU migrem para outros fornecedores de energia via o sistema interligado, OU generalizem a fuga para sistemas de geração distribuída OU, ainda, judicializem seus contratos firmes de fornecimento para resistir a um eventual processo de socialização compulsória de perdas em economicidade energética.

Creio, pois, que essa privatização atabalhoada, possui em si mesma, ao fim a ao cabo, os elementos que irão por certo levar à sua revisão – agora, ou quando seus efeitos deletérios se generalizarem sobre os PRÓPRIOS AGENTES PRIVADOS que estão na ponta do consumo eletro intensivo, o que, em síntese, criará uma enorme INSEGURANÇA JURÍDICA para aqueles que entre desassombrados e destemidamente darão seus pareceres para utilizar recursos de terceiros de fundos, acionistas desavisados ou que nada entendem de questões regulatórias, a se lançar como financiadores ou investidores de tão temerária iniciativa.

Um buraco que engole o outro

As primeiras reações ao “choque pandêmico” que colocou o mundo todo de joelhos, foram muito similares àquelas enfrentadas quando o homem descobriu o fogo e deixou de temer a escuridão.

Arrependidos (eis que tementes por, no fundo, não ignorar que sua ação predatória na exploração insana e desigual de pessoas e do meio ambiente talvez tivesse antecipado a inevitável prestação de contas), todos se puseram a observar a antiga beleza de um céu mais limpo e a solidariedade que buscava amparar os que estavam sendo impactados pelos efeitos de um vírus do qual nada ou muito pouco se sabia

Mas a realidade da situação impôs a busca de soluções compatíveis com as possibilidades de cada país sofrer, absorver e reagir ao que ia se mostrando dia a dia cada vez mais assustador.

Duas ações emergiram: o uso do conhecimento de ponta para buscar a saída eficaz para o combate ao vírus transmissor da pandemia, assim como, em paralelo, seguir suas mudanças e ao longo do seu processo de transmissão e adaptação a diferentes situações num mundo diverso e diferenciado.

E, de modo complementar, organizar os meios para mitigar os efeitos sobre todo o cluster do complexo segmento de saúde (de todo o CAPEX e do OPEX necessário para sua operação —notadamente o capital humano de alta especialização e capacitação – assim como toda a infraestrutura requerida para instrumentalizar o sequenciamento da atividade virótica (testagens exames prospectivos e preventivos, identificação e novas variantes e daí por diante).

Até aí, não obstante a indeterminação de início reinante, quase como que em um ensaio organizado à distância, países diferentes seguiram os mesmos protocolos para aguardar suas primeiras ondas de contágio.

E todos os que tinham essa condição, passaram a contratar com RECURSOS PÚBLICOS, diretamente ou pela negociação e lastro de seus CONTRATOS DE FORNECIMENTO firme e irretratáveis com centros de excelência reconhecidos, o desenvolvimento de vacinas para prover o enfretamento ao vírus.

Mesmo SEM A ANUÊNCIA PRÉVIA de seus centros de certificação sanitária, como a OMS, FDA (USA), a EMA (CEE), MHRA (Reino Unido), ANVISA (Brasil) ou MHLW (Japão) ou NMPA (China); ou MESMO SABENDO dos riscos inerentes às essas atividades, e MESMO SEM CONHECER de antemão o número de doses a serem prescritas ou outras variáveis que costumam parametrar a aquisição de suprimentos vacinais.

O Brasil, também seguiu esses passos foram seguidos, com a contratação da vacina desenvolvida pelo Consorcio ASTRA ZÊNECA e a Universidade de Oxford, no Reino Unido.

Ou seja: com risco de sucesso, sem autorização da ANVISA ou da Agência do Reino Unido (MHRA) e antes mesmo dos testes para a determinação do nível de eficácia a ser obtido pela vacina.

O que mudou; ou quem mudou o rumo das ações até então seguidas?

E transformou em exigência pétrea, irrecorrível, informações que não eram ainda disponíveis para quaisquer outros fornecedores (inclusive a próprio Consórcio ao qual o país aderiu)?

Com o país se aproximando, um ano e três meses depois, da marca de 500.00 (meio milhão) de mortos pela COVID-19; e, com um índice de cobertura de vacinação efetiva (duas doses das vacinas que foram adotadas no país, APENAS neste ano), que estará por volta de 11%, a verdade é que o desastre da gestão do choque pandêmico no Brasil é uma calamidade em si mesma.

No mercado costuma-se dizer que a forma mais rápida para cobrir um buraco é abrir um outro maior…para engolir o buraco menor…e blindar o que puder do patrimônio dos sócios e executivos…além de torcer por um eventual novo e desatento stakeholder…

Seja pelo motivo que se possa atestar mediante as investigações ora em curso (CPIs, ações de partidos e representantes da sociedade civil em foros nacionais ou externos, investigações de organismos independentes de organizações multilaterais, entre outros) – e que vão desde a adoção de estratégias escabrosas como a busca natural (sic) da imunidade de rebanho, a adoção tratamentos já banidos pela ciência – a verdade é que o desastre já aconteceu.

O “buraco menor” já está sendo engolido pelo “buraco maior”!

Qualquer Ministro da Saúde é mero anteparo para cavar um buraco maior em plena luz do dia.

De nada adiantará a aplicação tardia de medidas que tinham sentido e importância se tivessem sido tomadas ainda em meados do ano que passou.

Manter o mínimo de exigências como o uso de máscaras e evitar a não aglomeração – pelas parcelas da população que ainda possuem algum empatia ou espírito humanístico – e guardar distanciamento (índice que hoje está perto de 30% nas principais aglomerações, ou nem isto), por certo será importante.

Os artífices dessa situação agora estão na fase de procurar a autopreservação para escapar do “longa manus” da justiça que por certo virá.

Para blindar os “sócios e executivos” da hora, resta apostar sofregamente no fechamento das prerrogativas institucionais ora vigentes: é para isso que se armam espíritos de confronto e se busca a subordinação dos interesses do Estado aos nefandos princípios de governos e pessoas.

Nada é tão atual (não obstante o seu caráter caricato e anedótico, ou talvez por isso mesmo) do que rever no YouTube ou NETFLIX, “O gato que ri”, do (neste momento) visionário e profético Peter Sellers.

Ou relembrar o Visconde de Cellorigo, na Espanha em 1.616, ao se lamentar a crise que seu país passava quando dizia, impotente que: “aqueles que queriam fazer algo pelo país não podiam; e, aqueles que tudo podiam, não queriam”.

Plutocracia de Resultados e Plutocracia Assalariada

Afinal, para que serve a economia?

A pergunta que não quer calar é como um zumbido desses que acompanha o dia a dia de milhões de pessoas em todo o mundo: e, tal como ele, ou bem você se acostuma ou simplesmente se deixa ensurdecer.

Tanto mais depois que a pandemia deixou explicita a ferocidade da desigualdade que divide o mundo, em todas as declinações que o verbo dividir possa comportar.

Essa pergunta certamente não incomodava tanto quem pensava a Economia em seus primórdios. Basicamente, porque não havia quem nela pensasse a não ser como filosofia: ou seja, impregnada e entranhada no mundo real (de todos os seres viventes) e não apesar deles.

Instrumentalizá-la, quer como pseudociência, quer como um manual de boas práticas e procedimentos (sublimando suas raízes comportamentais e culturais de toda a ordem) apequenou-a e a infantilizou-a, a ponto de se tornar um meio de apropriação de interesses, onde o mundo e a sociedade não são, senão, elegantes ornamentos de composição.

Daí as teorias exóticas extremadas, das sociedades sem mercado ou dos mercados sem sociedade que pululam estéreis a cada velha crise; e arregaçando cada vez mais as desigualdades.

Pois, pela escala, sua superação passa a depender de mecanismos que OU requerem meios brutais de transferências de renda e da riqueza já acumulada OU da geração de novas fontes de renda e de riqueza inacessíveis pelos próprios mecanismos da ampliação da desigualdade (como níveis mais elevados de educação e de conhecimento).

Afora o paradoxo inevitável: levar renda mínima não pode parecer como uma ação assistencialista; nem, tampouco, se bem-sucedida, gerar uma situação que permita dar sustentabilidade a um modelo que é auto excludente e perpetuador das próprias desigualdades que se deseja superar.

Um caso interessante é a economia brasileira: à exceção talvez dos chamados Anos Dourados, em boa parte dos anos 50 – onde o salário-mínimo foi o que até hoje é apontado como aquele que mais se aproximou do seu conceito “legislado” às minúcias, pelo Decreto Lei que o criou (o DL 399, de 1938) – em todos os períodos anteriores e posteriores a esse, as desigualdades parecem só ter aumentado (embora possa se encontrar períodos de uma ou outra melhoria relativa dos padrões prevalecentes. Tal como na euforia das inclusões de vasta camadas da população nos mais recentes Planos Cruzado (efêmero) e Real (com efeitos mais consistentes); ou no período recente, onde a inclusão de maiores contingentes à classe média nos anos fez o país sair do “mapa da fome” mundial).

No mais das vezes, e principalmente com a financeirização desmedida que se alastrou por todo o mundo – na verdade uma crise perpetuada e encadeada de vários ciclos onde o excesso de liquidez financeira sempre gerou mais moeda e liquidez do que a originação de produção consistente para incrementar ganhos de produtividade do trabalho e do capital não especulativo alocado na produção –, a sociedade brasileira consolidou o perfil de uma Plutocracia de Resultados, consolidando e aprofundando os ganhos estéreis do capital financeiro, da renda especulativa da terra notadamente nos centros urbanos e da acumulação primitiva do capital nas áreas antecedentes e posteriores da produção.

Mais ainda: a esses quistos de desigualdade se juntaram àqueles que eram necessários para legitimar e gerar um arcabouço institucional para a sua expansão e perpetuação.

Surgiram então, os membros do que se poderia chamar de Plutocracia Assalariada.

Assim se criou como uma derivativo malsão, um contingente de sub castas nas áreas onde se legitimam tais desequilíbrios – de base institucional e representativa desses mesmos interesses – que também, e pour cause, também desenvolve mecanismos de geração de desigualdades expressas em altos ganhos e rendimentos diretos e indiretos, que podem ser resumidos no salários de referência que está por volta de R$ 50 mil (média dos salários doas presidente e do vice presidente do país).

Ora, o salário-mínimo definido pelo já citado DL 399 (1938) deveria estar na casa dos R$ 5 mil!

Convenhamos: se fosse assim, uma diferença entre o maior salário da república e o mínimo salário a ser percebido pelo cidadão que tivesse a qualificação para estar ocupando um posto de trabalho formal de até 10 vezes, até que poderia ser equivalente àquele encontrado em muitas empresas ou corporações…

Mas, para uma diferença entre R$ 50 mil e R$ 1.100,00, de 45 vezes, qualquer explicação que se dê é, com certeza, pelo menos ridícula!

No momento em que na política, o fetiche da vez é encontrar um Joe Biden inzoneiro (apud Ary Barroso), a única exigência dos fundos de financiamento de candidatos, das velhas oligarquias da Casa Grande & Senzala (apud Gilberto Freyre) e das oligarquias emergentes das áreas de facilities e de empoderamentos de ocasião (apud qualquer influencer ligadinho), só uma exigência é feita aos emergentes da vez: sem chance desse negócio de taxar super ricos, dividendos, ou —pior – tentar uma reforma tributária que mexa TAMBÉM nos impostos diretos).

Na real: então, vamos fixar que o desafio não e mexer no ganho de quem tem; mas, diminuir a diferença entre o maior e o menor nível salarial visível.

Sabendo que nos próximos 20 anos, a desigualdade vai permanecer no mesmo índice de 10:1 entre o maior e o menor de referência do setor púbico e o salário-mínimo do DL 399, toda a política de subsídios e de transferência passa a ter como prioridade quem produza bens e serviços para essa classe emergente de R$ 1.100,00 para R$ 5 mil, em termos reais, ao longo do tempo.

A começar com a formalização de quem se contrata: custo de formalização calculado proporcionalmente ao tamanho da empresa e incidente progressivamente até se atingir aos níveis atuais, a partir da carência de 36 meses.

Os subsídios e transferências que custam cerca de 4% do PIB serão mantidos ou serão crescentes para quem vai fornecer bens e salários para as faixas emergentes e decrescentes para as faixas hoje já aquinhoadas: ou seja, para esse pessoal, vale a teoria do mercado sem sociedade e, assim, eles passam a ser financiar pelos preços que se podem pagar pelo que produzem.

Basta uma meta: basta que seja de Estado e não apenas de governo.