Escrevi um artigo sobre ANATOMIA FISCAL há pouco tempo: antes das eleições presidenciais de 2018.

Naquela época, a questão fiscal já assombrava (até pelo default fiscal de alguns Estados da federação e o prenuncio de dificuldades para outros entes federados, à exceção da União, até então). Mas, poucos tentavam apontar o tamanho da encrenca e, tanto mais, falar de medidas amargas para superar as eventuais dificuldades: o fígado substituía o cérebro nas discussões e diagnósticos, programas e propostas deixaram de importar (como parece acontecer ainda hoje).

O cenário não mudou, infelizmente. A recuperação pós 2017, que nunca foi auto sustentável, acabou por se esboroar definitivamente. A Depressão está substituindo lenta e fragorosamente a Recessão. E messianicamente (sem trocadilho) se espera que “reformas futuras” de todos os matizes (sempre se lembra de uma mais importante e vital do que outra…) devam substituir a ausência de atitudes, gestos e ações seja do poder incumbente, seja dos que lhes poderiam fazer oposição.

A resposta, se não vem dos canais competentes, pode vir das ruas. Como aliás, precocemente já se insinua…

Os números mudaram de magnitude e de proporção: até porque o denominador que serve de razonador de qualquer equação de resultado e desempenho (PIB, Receita Corrente Líquida, Arrecadação, Faturamento, Vendas, Folha de Pagamentos e daí por diante) só faz diminuir, enquanto o numerador das equações (Despesas Obrigatórias, Despesas Discricionárias, Dívidas e Obrigações, Serviço de Dívidas (juros), Custos Diretos, Custos de Utilities e Facilities, entre outros) ou permanecem os mesmos ou até são recompostos para cima, mercê do poder corporativo de suas fontes geradoras.

Revelou-se, por isso mesmo, a agudeza da questão fiscal: até a “regra de ouro” tem hoje seu manto desvendado e é assunto corriqueiro nas discussões, o que só mostra que — por certo — será muito mais fácil maquiar, sofismar ou bulir com a regra, do que MUDAR A REALIDADE QUE AFRONTOU A REGRA: notadamente (claro…) pelo lado das “Despesas Agregadas”…do GOVERNO e de TODOS os entes federados…

Já aos demais agentes econômicos que não dispõem desse mesmo FUROR NATURAL, cabe ver exaurir o que resta de seus excedentes e assistir candidamente ao balé dos áulicos do legislativo e do judiciário ao drenar os excedentes ainda restantes até o último suspiro da economia — o que todos acham improvável já que, ou Deus há de se lembrar que é brasileiro, ou que um fenômeno exógeno ou uma genial ideia nativa, rompa espontaneamente a inércia que todos estão assistindo.

O obituário futuro há de demonstrar, ironicamente, que a causa mortis da situação obedeceu a velhos adágios conhecidos: entre eles, o bordão de que “ação sem reflexão leva à catástrofe; mas, reflexão sem ação leva à esterilidade”…

Enquanto esse dilema hamletiano consome os nossos últimos excedentes, buscam- se avidamente receitas extraordinárias que nunca mais se repetirão (como a venda de ativos públicos ou a liberação do restante das poupanças institucionais como o FGTS ou o PIS/PASEP para engordar as estatísticas sazonais do comércio de meio e do final de ano).

O PIOR de tudo é que se fazem ouvidos moucos sobre o DESTINO desses excedentes artificialmente criados: sem a compressão radical das DESPESAS CORRENTES dos entes federados — diminuindo drasticamente o tamanho Legislativo e do Judiciário, assim como a redução drástica dos contingentes funcionais, pela informatização e automação de processos e procedimentos — o refresco, se e quando houver, em nada vai de fato adiantar e logo vai demandar nova rodada de novas deprivações e sacrifícios.

A única via eficaz de ajuste está do lado das despesas correntes e de capital dos agentes públicos; até porquê os recursos não são gerados pelo poder públicos: são drenados da sociedade, vias os agregados de consumo individual e empresarial (financeiro e não-financeiro) para sustentar os orçamentos públicos;

Quem paga, na origem, os impostos dos entes federados?

O consumidor individual e empresarial: o primeiro, quando paga pelas mercadorias e pelos serviços que consome e pelos compra e venda de ativos que realiza.

Os produtores, comerciantes, prestadores de serviços e bancos ARRECADAM E TRANSFEREM a elevadíssima CARGA TRIBUTÁRIA do que vendem para esses consumidores individuais, para os entes federados (da União, Estados e Municípios), em diferentes prazos e condições de recolhimento (sim, há um giro da carga tributária antes que ela “pouse” nos cofres públicos e que podem ser gerenciados pelo gestor fiscal em nome de aumento de incentivos para exportações, incentivo a micros, pequenas e médias empresas, às safras, sem contar as renúncias de recolhimento em troca de custos e benefícios de transação realizadas por entes privados em áreas sociais como saúde e educação, pesquisa, inovação e tecnologia e dai por diante).

Por outro lado, quando as empresas são consumidoras de outros bens e serviços oferecidos por outras empresas, o mesmo ciclo se registra: quem PAGA o imposto é o consumidor empresarial do bem serviço ou patrimônio e quem RECOLHE os encargos, com “delays” semelhantes aos dos ciclos do consumo individual, é quem VENDEU os bens.

Quem PAGA a carga do sistema financeiro é quem PAGA pelo serviços prestados pelo setor financeiro (dos juros do serviço da dívida às tarifas cobradas pelos serviços que lhes dão sustentação): a CUNHA FISCAL é paga pelo CONSUMIDOR individual pessoal ou empresarial ou entre os agentes financeiros quando trocam fluxos no interbancários e nas transações em suporte à operações externas feitas por seus consumidores individuais ou empresariais. Os agentes financeiros apenas RECOLHEM esses recursos aso cofres públicos.

É isso o que acontece com a MASSA DE IMPOSTOS INDIRETOS sobre o consumo e a produção que circula em toda uma sociedade.

Afora os ganhos de produtividade, excelência, e especialidade de pessoas, empresas e instituições financeiras, esse GIRO ou TROCA-TROCA de circulação fiscal ajuda a gerar um ganho ou um EXCEDENTE DE RENDA que só cabe à tributação direta onerar, em busca da equalização e da equanimidade fiscal entre agentes econômicos de uma sociedade.

É essa MASSA FISCAL que constitui a FONTE PRIMÁRIA da liquidez fiscal de qualquer economia e que é a BASE de seus orçamentos públicos.

Em equilíbrio, é como se os entes federados aos se apropriar dessa massa de impostos indiretos e diretos agisse como o GESTOR DE UM FUNDO DE INVESTIMENTOS para gerir o recursos drenados da sociedade a que, afinal representa.

Ora, se os custos administrativos desse gestor são exagerados, ou maiores do que a sociedade está disposta a pagar — tal como aconteceu quando o povo e seus representantes nos PARLAMENTOS impuseram as Cartas Magnas aos REIS que eram o Estado antes do advento das Repúblicas que colocaram limites aos gastos reais, tal como uma Lei de Responsabilidade Fiscal de então — ou se trocam os administradores do FUNDO, assim como se revê os custos de administração dos gestores e se muda o regulamento do FUNDO para comportar situações não previstas pelos seus cotistas institucionais mais legítimos e originais.

Ou seja, na regra atual, os que contribuem para o FUNDO veem os seus gestores, que DISPENDEREM fatias cada vez maiores desse FUNDO(sic) para pagar seus custos de manutenção…

Mas, e as Casa de Contas, e as Comissões do Legislativos e do Judiciário que já existem para esse fim? Sim e se apropriam de fatias da mesma fonte…

Informações para saber do estado das contas, existem e são fartas: o Tesouro Nacional (e seus espelhos nos demais níveis federados) e os mecanismos constitucionais como as LDOS, LOAS e os Anexos de Riscos Fiscais (ARF) e Metas Fiscais AMF), além da própria Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) também existem: mas os governantes e os ordenadores de despesas a seu mando, não tiveram PODER suficiente (não obstante a LEI DE RESPONSABILIDADE) que permitisse FREAR a farra fiscal de muitas unidades federadas nos últimos dez anos, notadamente.

Há alguns fetiches por trás disso: “governos não quebram”, é o que diz o mercado!

O benchmarking recente do Rio de Janeiro mostra a falácia do argumento: diretamente, é o que se vê até hoje; indiretamente, os milhares de empreendimentos e pessoas atingidas pela onda de calote público; e de forma intangível (mas perversamente contundente e eloquente), os índices de violência e barbárie hoje existentes: imagine se os governos quebrassem (…).

“Os dados de pessoal” (máquina púbica) é o que explicam o caos: o RGF do Governo federal mostra que os Gastos Diretos de Pessoal estão abaixo do percentual de risco, ou o LIMITE MÁXIMO da LRF, que é de 37,9% da RCL: mas, se imputados os gastos com o Regime Previdenciário, a conta explode! Como em vários Estados e cidades! E ainda há PREFEITOS e POSTULANTES ÀS PREFEITURAS que são contra os ajustes previdenciários para não ter o desgaste de votos em ano de eleição (o mesmo acontece com muitos governadores).

Ou seja: o país como um todo está ilíquido do lado fiscal: a sua Receita Corrente Líquida, RCL (que é a sua capacidade real e efetiva de pagamento), não paga as suas contas. Nem a despesa de Pessoal (se somada com a conta previdenciária) e nem seus compromissos com terceiros (Dívidas).

Pouco importa neste contexto a Dívida sobre o PIB (outro fetiche): o Japão tem 253% de Dívida em relação ao PIB; os EUA, 104,4%, o Reino Unido 88%!

O que importa é que, nenhum desses países, têm tão baixa capacidade fiscal de pagar suas contas como o Brasil!

O Estado tem que caber num Smartphone – como os bancos e outros organismos que realizam grandes volumes de transações e movimentam grandes volumes de recursos financeiros –, e há que se trocar Endividamento por Direitos de Concessão, por exemplo, a par de se retomar a renda disponível, pela correção de 20 anos da base de cálculo do Imposto de Renda das Pessoas Físicas, e a simplificação da arrecadação dos mais de 90 tributos existentes. E permitir desonerações de gastos com Educação e Saúde privadas, em patamares maiores do que os ridículos índices hoje permitidos,

A miopia fiscal não permite perceber que, com maior renda disponível, aumenta a formalização das relações de trabalho (para haver usufruto das desonerações), e maior volume de arrecadação ao longo do tempo, porque, TODOS passam a pagar imposto e não apenas quem está nas relações formais do mercado de trabalho e da produção.

A desoneração que se deve fazer hoje, ANTES DE QUAISQUER REFORMAS, é para aumentar a renda disponível de indivíduos e empresas.

E essa é uma tarefa INDELEGÁVEL do Poder Executivo: sem isso, qualquer reforma irá por agua abaixo porque afinal NÃO SE MUDAM OS DESTINOS DA MASSA FISCAL: o ralo continua a ser o destino da massa que se arrecada EM SUA ORIGEM (mesmo que, com a REFORMA TRIBUTÁRIA se mude parte da ORIGEM dos tributos).

É o DESTINO DO GASTO que deve ser repensado e mudado: sem ele, quaisquer mudanças de origem estarão sempre fadadas ao fracasso ou à sua fátua e passageira margem.

No marketing político se diria: a questão que importa é o DESTINO do GASTO FISCAL, estúpidos!!!