As primeiras reações ao “choque pandêmico” que colocou o mundo todo de joelhos, foram muito similares àquelas enfrentadas quando o homem descobriu o fogo e deixou de temer a escuridão.

Arrependidos (eis que tementes por, no fundo, não ignorar que sua ação predatória na exploração insana e desigual de pessoas e do meio ambiente talvez tivesse antecipado a inevitável prestação de contas), todos se puseram a observar a antiga beleza de um céu mais limpo e a solidariedade que buscava amparar os que estavam sendo impactados pelos efeitos de um vírus do qual nada ou muito pouco se sabia

Mas a realidade da situação impôs a busca de soluções compatíveis com as possibilidades de cada país sofrer, absorver e reagir ao que ia se mostrando dia a dia cada vez mais assustador.

Duas ações emergiram: o uso do conhecimento de ponta para buscar a saída eficaz para o combate ao vírus transmissor da pandemia, assim como, em paralelo, seguir suas mudanças e ao longo do seu processo de transmissão e adaptação a diferentes situações num mundo diverso e diferenciado.

E, de modo complementar, organizar os meios para mitigar os efeitos sobre todo o cluster do complexo segmento de saúde (de todo o CAPEX e do OPEX necessário para sua operação —notadamente o capital humano de alta especialização e capacitação – assim como toda a infraestrutura requerida para instrumentalizar o sequenciamento da atividade virótica (testagens exames prospectivos e preventivos, identificação e novas variantes e daí por diante).

Até aí, não obstante a indeterminação de início reinante, quase como que em um ensaio organizado à distância, países diferentes seguiram os mesmos protocolos para aguardar suas primeiras ondas de contágio.

E todos os que tinham essa condição, passaram a contratar com RECURSOS PÚBLICOS, diretamente ou pela negociação e lastro de seus CONTRATOS DE FORNECIMENTO firme e irretratáveis com centros de excelência reconhecidos, o desenvolvimento de vacinas para prover o enfretamento ao vírus.

Mesmo SEM A ANUÊNCIA PRÉVIA de seus centros de certificação sanitária, como a OMS, FDA (USA), a EMA (CEE), MHRA (Reino Unido), ANVISA (Brasil) ou MHLW (Japão) ou NMPA (China); ou MESMO SABENDO dos riscos inerentes às essas atividades, e MESMO SEM CONHECER de antemão o número de doses a serem prescritas ou outras variáveis que costumam parametrar a aquisição de suprimentos vacinais.

O Brasil, também seguiu esses passos foram seguidos, com a contratação da vacina desenvolvida pelo Consorcio ASTRA ZÊNECA e a Universidade de Oxford, no Reino Unido.

Ou seja: com risco de sucesso, sem autorização da ANVISA ou da Agência do Reino Unido (MHRA) e antes mesmo dos testes para a determinação do nível de eficácia a ser obtido pela vacina.

O que mudou; ou quem mudou o rumo das ações até então seguidas?

E transformou em exigência pétrea, irrecorrível, informações que não eram ainda disponíveis para quaisquer outros fornecedores (inclusive a próprio Consórcio ao qual o país aderiu)?

Com o país se aproximando, um ano e três meses depois, da marca de 500.00 (meio milhão) de mortos pela COVID-19; e, com um índice de cobertura de vacinação efetiva (duas doses das vacinas que foram adotadas no país, APENAS neste ano), que estará por volta de 11%, a verdade é que o desastre da gestão do choque pandêmico no Brasil é uma calamidade em si mesma.

No mercado costuma-se dizer que a forma mais rápida para cobrir um buraco é abrir um outro maior…para engolir o buraco menor…e blindar o que puder do patrimônio dos sócios e executivos…além de torcer por um eventual novo e desatento stakeholder…

Seja pelo motivo que se possa atestar mediante as investigações ora em curso (CPIs, ações de partidos e representantes da sociedade civil em foros nacionais ou externos, investigações de organismos independentes de organizações multilaterais, entre outros) – e que vão desde a adoção de estratégias escabrosas como a busca natural (sic) da imunidade de rebanho, a adoção tratamentos já banidos pela ciência – a verdade é que o desastre já aconteceu.

O “buraco menor” já está sendo engolido pelo “buraco maior”!

Qualquer Ministro da Saúde é mero anteparo para cavar um buraco maior em plena luz do dia.

De nada adiantará a aplicação tardia de medidas que tinham sentido e importância se tivessem sido tomadas ainda em meados do ano que passou.

Manter o mínimo de exigências como o uso de máscaras e evitar a não aglomeração – pelas parcelas da população que ainda possuem algum empatia ou espírito humanístico – e guardar distanciamento (índice que hoje está perto de 30% nas principais aglomerações, ou nem isto), por certo será importante.

Os artífices dessa situação agora estão na fase de procurar a autopreservação para escapar do “longa manus” da justiça que por certo virá.

Para blindar os “sócios e executivos” da hora, resta apostar sofregamente no fechamento das prerrogativas institucionais ora vigentes: é para isso que se armam espíritos de confronto e se busca a subordinação dos interesses do Estado aos nefandos princípios de governos e pessoas.

Nada é tão atual (não obstante o seu caráter caricato e anedótico, ou talvez por isso mesmo) do que rever no YouTube ou NETFLIX, “O gato que ri”, do (neste momento) visionário e profético Peter Sellers.

Ou relembrar o Visconde de Cellorigo, na Espanha em 1.616, ao se lamentar a crise que seu país passava quando dizia, impotente que: “aqueles que queriam fazer algo pelo país não podiam; e, aqueles que tudo podiam, não queriam”.