A Folha de São Paulo deste sábado (05 de outubro de 2019) apresenta estudo com base na Pesquisa de Orçamento Familiar (POF) do IBGE entre 2017/2018, atestando o empobrecimento — et pour cause– o aumento da desigualdade da população brasileira.

Foram analisados os dados de 69 milhões de famílias, em 75.000 domicílios de todo o país.

Quase 10% da renda nacional está nas mãos de 2,7% das famílias, com renda de mais de R$ 23 mil reais: todavia, em quase dez anos, o número de famílias com renda MENOR do que 06 salários mínimos passou de 68,40% para 73,03%. E nesses extratos de menor renda, os gastos com mobilidade urbana (concessões de transporte público) cresceram mais do que os gastos com alimentação, assim como se expandiram as despesas com usos de outros bens ofertados sob concessão pública, como gastos com celulares e acessórios (com mais de 200% de acréscimo em relação à POF de 2008/2009.

A habitação continua a representar quase 30% do gasto médio das famílias. E os gastos como tributação, contribuições trabalhistas e gastos com serviços financeiros tomam (quase) outros 12% da renda.

Num passado não muito distante, esses dados seriam uma bússola importante para quem está no comando da economia do país ou, em outro plano, quem vai estruturar Planejamento e Programas para entes subnacionais ou Programas de Governo para partidos políticos na disputa bienal das eleições.

A POF mostra despesas médias da ordem de R$ 4,6 mil e renda média de R$ 5,4 mil: mas, com a desigualdade de renda, pode-se inferir que há pouca margem para crescimento vigoroso e sustentável da poupança bruta nacional.

E, de forma singela, sem esse excedentes de renda, aliado ao elevado desemprego e à crescente informalidade, há um cenário de crescimento de demanda e oferta agregada pouco promissor.

A constatação da POF também corrobora o perfil traçado em um artigo deste BLOGCONPPP de maio de 2018:

No Brasil, em março de 2018, de 169 milhões de pessoas em idade para trabalhar, 91 milhões estavam ocupadas e 14 milhões desocupadas: ou seja, pouco mais da metade trabalhava e gerava renda; outros 26 milhões estavam desocupados e desempregados, sem criar valor.

Os postos de trabalho, em todos os setores de atividade, são oferecidos por pouco mais de 20 milhões de empresas e organizações de diversos tipos, sendo 12 milhões delas conduzidas por empresários individuais.

Aquele que possui emprego formal, com carteira assinada, contribui com uma expressiva parcela de sua renda para manter o custeio e o investimento da máquina que o Estado urdiu para prestar uma variada gama de serviços públicos, quase todos garantidos (sic) pela Constituição Federal.

Para tanto, paga impostos diretos sobre o salário, impostos indiretos sobre o que consome e tarifas e taxas sobre os serviços públicos (concessionados ou não) que utiliza. Se não conseguir acessar os serviços públicos ou não confia em sua qualidade, paga uma tributação intangível, ao destinar parcela adicional de sua renda para suprir o que não lhe foi provido pelo poder público, via o ensino e a saúde, por exemplo, providos por empresas particulares.

Se precisa financiar seu custeio, paga impostos embutidos no uso dos recursos que toma nos bancos; paga o risco de crédito pela inadimplência de desconhecidos (a taxa de inadimplência dos “outros”); e taxas de juros reais que compensam (como protegem) a altruísta plêiade de banqueiros, que se arrisca (sic) a aplicar os recursos de outros tantos anônimos, em títulos da dívida pública que perderam o grau de investimento de TODAS as agências de risco.

Feitas essas deduções, cabe a ele usufruir, ou seja, consumir e poupar, a partir do que se chama de renda disponível.

Raciocínio similar se faz do lado dos produtores que empregam esses resilientes: o preço do que vendem, gera o quanto que necessitam para organizar a produção, repor e manter insumos, máquinas e implementos. E tal como acontece com aqueles que empregam, há que
contribuir com impostos diretos, indiretos, tarifas para o Estado lhe prover infraestrutura, ambiente negocial adequado, entre outros requisitos diretos e indiretos que influenciam a produção. Também se tiverem de ter acesso a recursos extras, alheios ao ciclo de produção, pagam juros para proteger do risco elevado, a banca denodada que sustenta a continuidade do projeto de sociedade vigente. O que sobra, também corresponde ao seu ganho disponível para manter a atividade e seus excedentes.

Os gastos dessas duas parcelas de renda disponível de empregadores e empregados é que gera a produção e a riqueza nacional.

Em termos de PIB que encerrou 2017 com um valor de cerca de R$ 6,5 trilhões, segundo o IBGE, o Setor Financeiro responde por volta de 6,0% do PIB (ou quase R$ 400 bilhões) e emprega cerca de 2,0% das pessoas ocupadas nos pais.

Já o Setor Público responde por 11% a 12% das pessoas ocupadas: seu tamanho no PIB é de pouco menos de R$ 100 bilhões, considerando-se a administração direta. Entretanto, existem 320 empresas estatais indiretas (264 não financeiras e 56 empresas financeiras, nas esferas de
administração federal, do distrito federal, estaduais e municipais), que respondem por cerca de mais 300 bilhões (sem contar participações e partes societárias dos agentes públicos da administração direta e indireta).

Se deduzirmos dos pagamentos que empregadores e empregados os gastos de impostos (via tributação direta e indireta) e os gastos incorridos pelo pagamento dos serviços públicos que utilizam dos três níveis de governo, quanto lhe sobra de RENDA DISPONÍVEL para poupar, consumir, investir (famílias) ou para criara reservas para investir, consumir na produção e manter a produção funcionando?

E se, adicionalmente, deduzirmos o que esses dois agentes econômicos (empregados e empregadores) gastam pelo eventual uso de recursos de terceiros para cobrir seu consumo corrente (OPEX) ou seus gastos de investimento já realizados ou em andamento (CAPEX), o que lhes sobra para alavancar a formação bruta de capital fixo do país?

Quem vai puxar os vagões, se o consumo líquido das famílias ou o investimento líquido das empresas é pífio?

Como calcular ou estimar a contrapartida de valor desse montante que é drenado da renda ou do produto de empregados e empregadores?

Ou seja, QUEM se está financiando na economia (e a que custo) e QUAIS serviços estão sendo oferecidos (e a que custo) para a sociedade.

O saldo dos empréstimos do setor financeiro ao setor privado (empresas e famílias) é algo como R$ 3,1 trilhões (ou quase 48% do PIB atual): no Japão e em vários países em maior estágio de desenvolvimento, essa percentagem costuma ser um múltiplo do PIB e não uma
parcela dele (154%, no caso japonês).

E quem toma os outros 52% do PIB? É o setor privado (de famílias ou empresas) que não precisa ou não quer tomar mais dinheiro para se alavancar na economia?

O setor público – que diretamente via impostos ou indiretamente via tarifação – retira uma expressiva soma de recursos de empresas e indivíduos, ainda capta parcelas crescentes da liquidez da economia, via o mesmo setor financeiro, da ordem entre R$ 3,6 trilhões (em 2017)
e R$ 4,8 trilhões (em março de 2018), pela colocação de seus títulos e promessas de pagamentos a futuro.

Ou seja, o setor público toma mais dinheiro emprestado dos dotadores de poupanças, via o sistema financeiro, do que o setor privado das famílias e empresas: mesmo que a taxa básica de juros da economia esteja caindo…

Outrora (sic), diziam as teorias assim como as lendas, que quando há um tomador primaz a drenar liquidez, o custo para os demais tomadores de recursos se eleva bastante: é isso que explica 315% de taxas anuais de créditos para consumo de famílias, no cartão de crédito ou em algumas linhas de crédito pessoal? Ou os escandalosos 2,08% ao mês (ou 28,02% ao ano para uma inflação anual de 4,5%) para crédito consignado a pensionistas do INSS? Ou via débito em conta de assalariados (que alguns ainda pretendem securitizar(sic e argh!) com recursos do FGTS)?

É pelo grau (sic) de risco?

E qual é o grau de risco de entupir com títulos públicos, SEM GRAU DE INVESTIMENTO, as carteiras de fundos (de curto prazo ou previdenciários) e os balanços dos bancos na crença insana que governos não quebram (vide RJ, RS, MG e outros). Gerando e distribuindo lucros de bilhões que são pagos pela divida bruta de um governo que demonstra incapacidade crescente de gerar poupança fiscal para resgatar seus compromissos?

Mesmo que as notas de rating desses bancos tenham sido rebaixadas no mesmo momento das perdas dos graus de investimento do país?

Isto não quer dizer nada?

Se o setor de intermediação capta R$ 3,1 trilhões para suprir créditos a famílias e empresas e capta R$ 4,0 trilhões para carregar títulos (ou um PIB anual), o que aconteceria se o setor financeiro não passasse mais a contar com os ganhos do rentismo parasitário da divida
pública?

Vão gerar bilhões de resultados anuais aumentando tarifas de prestação de serviços? Haveria competência para originar ganhos provenientes da assunção de novos riscos de créditos a serem buscados no mercado, a taxas menos abusivas e escorchantes, por óbvio? No nível da
SELIC atual, por exemplo? Vão financiar infraestrutura de longo prazo como deliram alguns próceres de PPP e Concessões?

Creio que sobrariam muito poucos bancos… a oligopolização (e seus elevados custos) seria madrasta de um mundo selicado para tomadores preferencialmente privados…os bancos desaprenderam a originar e a bancar novos negócios…e faz muito tempo (a inadimplência
branca e o estouro das recuperações judiciais de créditos mastodônticos que o digam).

Qual o futuro de uma economia que drena renda e valor dos ganhos do trabalho e da produção em prol da oferta de serviços públicos custosos e deficientes e que oferta crédito insuficiente e caro para quem quer trabalhar (OPEX) e investir (CAPEX)?

Que AÇÕES PRESENTES OU FUTURAS dos governos atuais (ou dos que querem ascender) estão contemplando esses dados e informações para REINCLUIR esses contingentes de renda potencial para o crescimento da sociedade e da economia?

E em que PRAZO se pode esperar a mudança prevista ou proposta por esses governantes?

Criar valor na economia, substituindo o que destrói valor (impostos elevados e juros escorchantes), elevando a renda disponível, continua a ser o grande desafio da economia brasileira.

Até lá…continuamos sem rumo…e sem prumo…